sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM

JUIZ EXPLICA PORQUE A SAÍDA É BENÉFICA

O mundo contemporâneo passa por importantes e rápidas transformações, especialmente nas áreas da economia, indústria, tecnologia e telecomunicações, o que tem afetado a vida de cada um. O direito não poderia ficar fora de todas essas mudanças.

Uma das críticas que mais freqüentemente são feitas à justiça é a sua morosidade, o que compromete sua efetividade, tanto que Rui Barbosa já disse há muito tempo que a justiça soa prejudicada: mudar o mecanismo ou procurar escapar dele. Como é difícil demais fazer mudanças no serviço de prestação jurisdicional, torna-se mais fácil buscar formas alternativas de solução dos conflitos jurídicos, inclusive com a adoção de modelos existentes adiá-los não é nem sequer justa.

Várias soluções têm sido procuradas, entre as quais estão a desformalização do processo, como se vê das recentes reformas do CPC, que procuram tornar mais práticos, rápidos e efetivos os procedimentos judiciais, eliminando alguns "gargalos" ao bom trâmite processual. Os juizados de pequenas causas também se mostram como importante instrumento para a dinamização da justiça, além de proporcionarem acesso a ela por parte das pessoas mais humildes e desvalidas. Ainda falta o grande salto de eficiência que a informatização geral do Judiciário pode proporcionar. Espero que isso aconteça em breve.

Pois bem, sempre que o mecanismo estatal de fazer justiça mostra-se ineficiente surgem duas opções para as pestes em outros países. Nesse contexto, convém o estudo da arbitragem, que não é nova no nosso direito positivo, tanto que o pacto de compromisso arbitral já estava previsto no art. 1.072 e seguintes do CPC. O art. 301, IX, já previa o compromisso arbitral como uma defesa processual para impedir a apreciação do mérito. O que ocorre é que surgiu uma nova lei sobre a arbitragem (lei 9.307/96), que introduziu importantes modificações, que merecem a nossa reflexão.

Definição

Pela arbitragem privada, as partes resolvem submeter suas lides resultantes de determinadas relações jurídicas de direito privado a um tribunal arbitral, composto por um árbitro único ou uma maioria deles, designados, em princípio, elas partes ou por uma entidade por elas indicada. Mediante a instituição do tribunal arbitral, exclui-se a competência dos juízes estatais para julgar a mesma lide.

Apesar de existir certa resistência à arbitragem, decorrente de nossa cultura e de nossa tradição, a tendência é de que ela se expanda, não só em razão das mudanças na lei a respeito, como também pela tendência que se vê de incremento das formas alternativas de justiça. Por exemplo, a lei dos juizados especiais prevê a possibilidade de atuação de juízes de carreira, juízes leigos, conciliadores e árbitros (lei 9.099/95, art. 7º).

Incidentalmente, nos juizados de pequenas causas, pode ser escolhida a arbitragem como forma de solução do litígio (lei 9.099/95, arts. 24 a 26), de modo que, alguns casos, a lei parece indicar ou induzir o interessado a procurar outras formas de solução dos litígios, deixando a justiça tradicional para o último caso. Ainda assim, nos processos tradicionais, parece que se quer evitar a sentença como principal forma de solução, tanto que recentemente foi acrescentado um inciso ao art. 125 do CPC, que trata dos deveres do juiz, para que este tente, a qualquer tempo, conciliar as partes (art. 125, IV, CPC).

Além disso, houve uma mudança procedimental tanto no rito ordinário quanto no sumário, para que neles passasse a ser realizada a chamada audiência de tentativa de conciliação ou audiência prévia (arts. 277, 278 e 331do CPC).

Mesmo nas causas comuns, pode ser feito o compromisso arbitral no decorrer do processo (art. 9º e seguintes da lei 9.307/96), fazendo que certo caso saia da justiça estatal e passe para um tribunal arbitral. Numa linguagem figurada, é fácil perceber que são vários os afluentes que deságuam na arbitragem, indicando que ela muito deve crescer entre nós.

A arbitragem tem especial importância no direito privado internacional, nas relações comerciais, cada vez mais numerosas em função da globalização dos mercados. Por exemplo, por meio da arbitragem os processos são normalmente sigilosos, ao passo que no Judiciário a regra é a publicidade, que em certos casos é muito prejudicial. A comunicação no Judiciário é feita por meio de uma burocrática e demorada carta rogatória, ao passo que na arbitragem pode se usar correio, fax e mesmo Internet.

Os juízes de carreira normalmente não estão preparados para resolver as pendências internacionais, que costumam ser complexas dos pontos de vista técnico e jurídico, ao passo que o árbitro pode ser escolhido entre pessoas que tenham essa capacitação especial. O número de recursos também costuma ser menor na arbitragem, o que lhe dá maior agilidade, e os custos também são normalmente menores.

Se forem tantas as vantagens, por que antes não foi ampliada a arbitragem no Brasil? Nada tem só vantagens. Um dos pontos até hoje em discussão diz respeito à imparcialidade dos árbitros, que tendem a defender os interesses das empresas que os indicaram. No caso brasileiro, a legislação antiga exigia que o laudo arbitral fosse depois homologado pelo judiciário, o que tornava a arbitragem uma opção desinteressante.

Convenção de arbitragem

Para que se faça opção pela arbitragem é preciso que pessoas capazes de contratar dessa forma decidam dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1º), podendo ser ela de direito ou de eqüidade (art. 2º), sendo que neste caso os árbitros não ficam vinculados a nenhuma regra jurídica, salvo as de ordem pública (§1º). No que diz respeito às regras jurídicas, podem ter especial importância os princípios gerais de direito, os usos e costumes e as regras internacionais de comércio (§2º).
Há duas formas de ser convencionada a arbitragem: a cláusula compromissória e a convenção de arbitragem (art. 3º).

A cláusula compromissória. Ela é feita de forma contratual e preventiva, pois os interessados assim dispõem antes de terem entre si um litígio qualquer (art. 4º), devendo ser sempre feita por escrito, no corpo do próprio contrato ou não (§1º), mas nos casos de contrato de adesão é preciso que ela tenha um destaque especial para ter validade (§2º).

Não há o que poderíamos chamar de um "Código Processual de Arbitragem", de maneira que as partes podem estipular qual o rito que será seguido por elas e pelos árbitros, mas os princípios processuais devem ser observados, como por exemplo, o contraditório (art. 5º). Existe ainda a possibilidade de ser adotado o rito padronizado de um tribunal de arbitragem.

Instituição da arbitragem. A lei 9.307/96 diz como deve ser feita a instituição da arbitragem, que na verdade é o início do procedimento da arbitragem, ocasião em que normalmente são escolhidos os árbitros (art. 6º), mas as partes também têm liberdade para convencionar sobre isso (art. 5º, in fine).

Uma parte intima a outra pelo correio para firmar o compromisso arbitral, sob pena de lhe ser demanda na justiça estatal uma ação para esse fim (art. 6º). Nessa ação a parte resistente é citada para em audiência assinar o compromisso arbitral, cujos limites devem constar da inicial devidamente instruída (art. 7º e §1º). O juiz tenta um acordo sobre o litígio ou pelo menos sobre o compromisso (§2º), decidindo em seguida (§3º), inclusive nomeando árbitros, se as partes não tiverem feito isso (§4º). A ausência do autor é demonstração de desinteresse e o processo é extinto (§5º), mas a ausência do réu tem os efeitos práticos da revelia (§6º), tendo a sentença o mesmo efeito do compromisso arbitral (§7º).

Autonomia da cláusula arbitral

A cláusula arbitral é tão autônoma em relação ao negócio principal que pode até mesmo ser estipulada em documento separado (art. 4º, §1º). Além disso, ela tem validade independente da validade do contrato principal, de modo que a nulidade do contrato não contamina de nulidade a cláusula (art. 8º). Neste caso, o tribunal arbitral decidirá a respeito da validade do contrato (art. 8º, parágrafo único). Podemos ver nessa regra uma exceção ao princípio de que o acessório segue o principal. Aqui, na verdade, a parte útil não é contaminada pela parte inútil.

Obviamente que a cláusula arbitral deve preencher todos os requisitos legais de validade. Assim, se menores fazem um contrato e estipula a cláusula, não vale o contrato e nem a cláusula. Tem-se dito tribunal arbitral, mas na verdade pode ser indicada uma única pessoa como árbitro. É comum cada parte indicar uma pessoa e estas juntas indicarem uma terceira, que presidirá o tribunal arbitral (art. 9º). Se não houver consenso, o juiz estatal escolherá um árbitro para presidir (art. 13, §2º) O que importa é que o número seja ímpar (art. 13, §1º). As partes podem também indicar os suplentes.

A arbitragem na forma de compromisso arbitral destina-se a fazer com que um caso que já está tramitando perante a justiça estatal seja decidido pela justiça privada. Isso pode ser feito por um pacto judicial ou extrajudicial, sendo que no primeiro caso deve ser documentado por termo nos autos; no último há necessidade de escritura pública ou particular com duas testemunhas (art. 9º, §2º), com os requisitos do art. 10.

O árbitro não precisa ter formação jurídica, mas ser capaz de entender o problema e dar-lhe uma solução, um julgamento, além de ter a confiança das partes (art. 13). Nas causas tecnicamente mais complexas, espera-se que o árbitro tenha um conhecimento especial do assunto, mas nada impede que ele se valha de um perito, como qualquer juiz de direito faria.

Ao árbitro aplicam-se todos os impedimentos dos juízes estatais (arts. 14 e 15), sendo feitas as substituições necessárias. Se não for possível a substituição porque as partes a vedaram (art. 16, §2º), ficam extintas o compromisso arbitral (art. 12, II).

É natural que ao árbitro se apliquem as regras de impedimento e suspeição porque na realidade é ele um juiz de fato e de direito (art. 18), até mesmo com poderes mais amplos porque o seu julgamento não fica sujeito a recurso ou homologação do Poder Judiciário (art. 18), sendo natural que ele seja equiparado a um funcionário público, para efeitos penais (art. 17).

Assim que o árbitro aceitar a nomeação considera-se instituída a arbitragem (art. 19) e quem tiver qualquer dúvida ou reclamação deverá manifestar-se na primeira oportunidade (art. 20), como determina o princípio da boa fé.
Se o árbitro decidir que a convenção não vale ou é incompetente, o caso será remetido para a justiça estatal (art. 20, §1º). Se for decidido o contrário, a parte prejudicada tem ação própria para pleitear na justiça estatal a nulidade da decisão arbitral (art. 20, §2º e art. 33).

Como já foi dito, as partes têm liberdade para estabelecer o procedimento arbitral, assim como para adotar algum procedimento padronizado ou mesmo delegar ao próprio árbitro poderes amplos para dirigir o rito (art. 21). É isto que se presume se elas não tiverem escolhido o rito (art. 21, §1º), que em qualquer caso deve respeitar os princípios processuais (art. 21, §§2º e 4º), mas não há presença obrigatória de advogado (art. 21, §3º).

O árbitro conduzirá a arbitragem de forma semelhante a um processo judicial, como já foi dito, ouvindo as alegações das partes, colhendo as provas e proferindo sua decisão, inclusive tentando a conciliação (art. 21, §4º), mas não tem autoridade para obrigar a testemunha a comparecer para depor. Para isso ele precisa se valer da justiça estatal (art. 22 e §§), que fará a condução sob vara.

A arbitragem admite medidas cautelares, mas devem ser pedidas pelos árbitros à justiça estatal (art. 22, §4º). Não há o princípio da identidade física do árbitro, mas o sucessor pode mandar repetir as provas colhidas por seu antecessor (art. 22, §5º). Não há regra determinando a presunção dos fatos não impugnados, mas isso decorre da lógica e o art. 22, §3º, que diz que a falta de defesa do requerido não impede que o árbitro dê sua decisão.
Já foi dito na página 03 que a arbitragem deve versar sobre direitos patrimoniais disponíveis, mas pode surgir controvérsia a respeito da disponibilidade do direito em discussão, a decisão a respeito deve ser tomada pela justiça estatal, ficando a arbitragem suspensa (art. 25).

A sentença arbitral não depende de homologação da justiça estatal, mas deve obedecer a certos requisitos formais, como por exemplo, ser feita por escrito (art. 24), devidamente assinada, podendo haver voto vencido. A sentença deve ter relatório, fundamentação e dispositivo (art. 26), tal qual a sentença estatal (art. 458 CPC), mas não há apelação para sua revisão.

Não há apelação, mas pode-se requerer algo semelhante aos embargos de declaração (art. 30), no prazo de 5 dias contados da notificação do julgamento (art. 29).
As partes podem estipular o prazo em que a sentença será proferida, mas a omissão a respeito faz com que ele seja de 6 meses (art. 23, "caput") com a possibilidade de ser prorrogado.

Além de não precisar de homologação estatal, a sentença arbitral tem o mesmo efeito jurídico de uma sentença judicial, numa autêntica "privatização da justiça", tendo inclusive eficácia executiva quando condenatória (art. 31).

Além dos "embargos declaratórios", contra a sentença arbitral só cabe ação judicial para sua anulação, no prazo de 90 dias (art. 33), desde que presente alguma das situações do art. 32, de forma semelhante à ação rescisória. Porém, decorrido o prazo para a anulação da sentença arbitral, a sua nulidade ainda pode ser alegada em embargos à execução, que deve ser sempre judicial (art. 33, §3º).

Sentenças estrangeiras

Como toda sentença estrangeira, a arbitral depende de prévia homologação do STF para produzir efeitos no Brasil (arts. 34 e 35), sendo poucas as hipóteses em que a homologação não será concedida (arts. 38 e 39). Porém, se for negada a homologação por problemas meramente formais, pode o pedido ser renovado, preenchidos os requisitos legais (art. 40), a exemplo do que ocorre com as sentenças que não julgam o mérito e que fazem apenas coisa julgada formal.

Generalidades

Pela cláusula compromissória percebe-se que as partes retiram do Poder Judiciário o direito de julgar os litígios decorrentes de certos contratos e depois, pela instituição da arbitragem, escolhem o árbitro, que recebe poderes que pela lei são do Estado juiz, numa espécie de mandato para julgamento, que se chama receptum arbitri. Esses poderes conferidos pelas partes e admitidos pela lei é que darão ao árbitro poderes até certo ponto maiores do que um juiz estatal tem.

O procedimento da arbitragem é sigiloso, não vigorando o princípio processual da publicidade, tanto que o árbitro tem que agir com discrição (art. 13, §6º).
Nem tudo são maravilhas no campo da arbitragem, pois nem todos os direitos são passíveis de serem arbitrados, mas só os patrimoniais disponíveis. Além disso, apesar de todos os seus problemas, a justiça estatal é gratuita nas pequenas causas e para aqueles que não podem pagar os processos comuns. Os juízes estatais são remunerados pelo Estado e nada cobram das partes pelos seus serviços, ao passo que a arbitragem é cobrada (art. 11, incisos V e VI). Os honorários devem ser tratados diretamente entre as partes e os árbitros ou as entidades de arbitragem.

Se o julgado arbitral não for cumprido espontaneamente, deverá ser executado, o que se dará perante a justiça estatal, como já ocorre com os julgados do próprio Poder Judiciário. O art. 584 do CPC relaciona quais são os títulos executivos judiciais e coloca entre eles o inciso III, que diz: é título executivo judicial a sentença arbitral e a sentença homologatória de transação ou de conciliação.

A arbitragem não é algo novo, nem mesmo no Brasil, que não tem tradição nesse campo. Os EUA utilizam amplamente a arbitragem. Em boa parte, a procura pela arbitragem se explica não só pelo aumento do comércio internacional, mas também pelos custos e, no nosso caso, pela ineficiência da justiça estatal, que é obsoleta, burocrática e demorada. Alguns fatores que ajudam a arbitragem a ser mais rápida é a existência de um prazo para que a sentença seja proferida e também a quase completa ausência de recursos. Quem opta por esse caminho está abrindo mão do princípio do duplo grau.

Há juízes com uma visão corporativista contrária à arbitragem, pois temem que a função que exercem perca importância ou mesmo eles percam poder. Pessoalmente, vejo a arbitragem com uma alternativa que tem a mesma finalidade da justiça estatal: dar, a cada um, o que é seu. O que a justiça estatal precisa fazer, se quiser dignamente enfrentar a "concorrência" da arbitragem é tornar-se mais eficiente, modernizar-se, informatizar-se, desburocratizar-se, tornar-se menos solene, menos formalista, mais efetiva, mais justa e mais acessível.

Se isso acontecer, teremos uma salutar convivência entre a justiça estatal e a arbitragem, em proveito de toda cidadania, que não pode ser e nem é obrigada a contratar a cláusula arbitral, pois isso é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90, art. 51, VI). Nem mesmo a via judicial das pequenas causas é compulsória, mas sim uma opção do autor (Lei 9.099/95, art. 3º. §3º).

Com essas cautelas teremos na arbitragem outra opção de justiça, escolhida pela vontade das partes, ficando afastada a injusta dicotomia temida por alguns inimigos da arbitragem, que é a transformação desta numa justiça eficaz e privada para os ricos, coexistindo com uma justiça estatal e ineficiente para os pobres, à semelhança do que ocorre hoje na área da saúde.

Seja bem-vinda a nova arbitragem entre nós. Que ela seja uma fonte saudável para os que têm sede de justiça.

Fonte: Consultor Jurídico

DA CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM E SEUS EFEITOS

Texto enviado ao JurisWay em 1/12/2009.
Por Alexandre Asfora

Formado em Direito pela UNICAP;
Pós Graduado em Direito Público - ESMAPE;
Capacitado como Juiz Arbitral pelo INAMA;
Capacitado como Madiador pelo INAMA;
Formado pela ESMAPE e ESMATRA.
Juiz Leigo do TJPE;

A Convenção de Arbitragem é um meio, normalmente privado, alternativo ao Judiciário para a solução célere, específica, adequada e sigilosa dos conflitos, tanto das Pessoas Jurídicas quanto das Pessoas Físicas no que tange aos seus direitos patrimoniais disponíveis, ou seja, uma forma extrajudicial de solucionarmos os litígios sem a necessidade de passar pelo Judiciário.

Notadamente, esta vertente tem como principal característica a ruptura com o formalismo processual, constituindo uma maior rapidez e dando mais liberdade as partes, para que possam conciliar o litígio ou para que haja o julgamento do mesmo, devendo ser levado em consideração um fator preponderante, a Sentença Arbitral, que além de ser irrecorrível, não poderá sofrer nenhum tipo de ingerência do Poder Judiciário, salvo no caso de argüição da nulidade da Sentença Arbitral, casos estes que estão devidamente elencados no Art. 32 da Lei 9.307/96.

A arbitragem preenche todas as funções da Jurisdição, embora não seja Jurisdição, levando consigo a harmonia entre as pessoas, tanto no exercício de seu direito como no respeito ao direito alheio, pois ao resolver o conflito está nada mais nada menos que utilizando o Direito escolhido pelas próprias partes, que em comum acordo inseriram a Cláusula Compromissória no contrato avençado entre eles mesmos.

Podemos acrescentar que em relação à Jurisdição Estatal, a Arbitragem possui inúmeras vantagens como a celeridade; liberdade de escolha do árbitro; especialização dos árbitros; liberdade de escolha da norma a ser aplicada; sigilo; informalidade; menor custo em relação ao Poder Judiciário e por último o clima de conciliação, pois foram as partes que decidiram pela Arbitragem, o que não deixa de ser uma concordância, pois eles se encontraram, conversaram e combinaram dirimir os litígios através da Arbitragem.

Desta forma, para que possamos nos utilizar da Arbitragem existe a necessidade de haver um conflito, porém, fundamentalmente, deverá existir a vontade das partes, que deverão através de uma Cláusula Compromissória optar por este meio extrajudicial a fim de dirimir todo e qualquer conflito que por ventura venha a ocorrer em decorrência do contrato pactuado pelos mesmos.

Ressalte-se que em não havendo Cláusula Compromissória no contrato as partes só poderão dirimir seus litígios através da Arbitragem no caso delas, em comum acordo, livre e voluntariamente assim decidirem, o que seria o Compromisso Arbitral.

Uma vez havendo a concordância dos contratantes a cerca da Arbitragem para dirimir litígios em decorrência do contrato pactuado entre eles, os mesmos devem estabelecer através de quem será realizada a Arbitragem, se de um órgão arbitral institucional ou de uma entidade especializada, devendo a Arbitragem ser instituída e processada por tais regras, afinal, como já dito anteriormente, as partes tem total autonomia para escolherem os Árbitros e as regras a que querem submeter as controvérsias que por ventura venham a ocorrer.

É através da Convenção de Arbitragem que as partes livres e voluntariamente poderão resolver suas controvérsias referentes a direito patrimonial disponível, submetendo-se ao Juízo Arbitral.

A Convenção de Arbitragem abrange a Cláusula Compromissória e o Compromisso Arbitral, conforme observamos no Art. 3º da Lei 9.307/96.

A Convenção de Arbitragem no Brasil será sempre necessária para que haja o Processo Arbitral, uma vez que não existe aqui a Arbitragem compulsória, terá, também, que ser escrita e suas controvérsias deverão respeitar o preceituado no Art. 1º da Lei Marco Maciel; trata-se da expressão de vontade das partes em resolverem os litígios, sendo de forma escrita e tendo as partes que se submeterem ao Juízo Arbitral, tornando incompetentes os Juízes e Tribunais do Poder Judiciário para resolverem a lide, pois ficou acordado e estabelecido que o litígio será dirimido por meio de Arbitragem.

Na Convenção de Arbitragem podemos observar como algumas das principais características a manifestação de vontade entre as partes para utilização da arbitragem como meio de solução de seus conflitos, também, não deverá ser imposta, e necessariamente deve ser escrita, não podendo ser genérica e só podem acordar sobre controvérsias relativas a direito patrimonial disponível.

A Convenção de Arbitragem é juridicamente autônoma perante a relação jurídica que se vincula. A nulidade desta automaticamente não conduz à nulidade da Convenção. Entretanto, é acessória, ou seja, sua existência depende da outra relação jurídica, pois se esta se extinguir, o mesmo ocorrerá com a convenção de arbitragem.

Quanto a Cláusula Compromissória, também conhecida como Cláusula Arbitral, podemos observar que ela surge antes do conflito, ou seja, as partes ao pactuarem um contrato, seja de ordem particular ou de relação de consumo, acordam que ocorrendo algum imbróglio no que concerne ao contrato o mesmo será resolvido pelo procedimento Arbitral e não pelo Poder Judiciário, tornando os Juízos e Tribunais incompetentes para processarem e julgarem as lides, pois estas serão resolvidas pela Arbitragem. Diz respeito a litígio futuro e incerto.

Observamos então que a Cláusula Compromissória é um pacto realizado entre as partes, pacto este que obrigatoriamente tem que ser lavrado a termo, e estar presente no corpo do contrato, ou em documento anexado ao mesmo, onde elas comprometem-se a resolver todo e qualquer litígio no que concerne a direito patrimonial disponível através da Arbitragem.

Desta forma, as partes ficam obrigadas a submeterem os litígios que por ventura surjam advindos do contrato pactuado entre elas a apreciação do Juízo Arbitral, só cabendo o ingresso no Poder Judiciário no caso único e exclusivo das Partes abdicarem dessa Cláusula Compromissória.

A Cláusula Compromissória deverá necessariamente que preencher alguns requisitos no tangente aos aspectos subjetivos, objetivos e formais.

Os requisitos subjetivos implicam em as partes firmarem a Cláusula Compromissória livremente, não podendo suas vontades estarem eivadas de vícios de consentimento, quais sejam, dolo, erro, simulação, fraude e coação, devendo também as partes terem capacidade de transigir sobre o objeto da Cláusula Compromissória, além da capacidade genérica.

Os requisitos objetivos são aqueles relacionados com o objeto da Cláusula, entenda-se, só poderá ser de direito patrimonial disponível, devendo para isso, tanto materialmente quanto juridicamente ser determinável e possuir valor econômico, entendemos por direito patrimonial disponível aqueles cujo objeto pode ser avaliado pecuniariamente, podendo ser transferidos de uma pessoa a outra.

Por fim, quanto aos requisitos formais, resume-se ao fato da Cláusula Compromissória ser escrita, tanto sendo inserida no contrato principal como em documento apartado.

A Cláusula Compromissória tem como características o fato de ser um contrato típico, disciplinado em Lei; formal, ou seja, necessariamente que ser escrito; bilateral; aleatório, só ocorrerá com um acontecimento incerto; execução diferida, só se realizará num momento futuro; individual, só obrigando as pessoas que tem participação efetiva e direta em sua celebração; e acessório, só existindo em virtude de outra relação jurídica.

Por fim, podemos distinguir a Cláusula Compromissória de duas formas: a Cláusula vazia e a Cláusula Compromissória cheia.

De acordo com os grandes doutrinadores, as Cláusulas cheias são as que contêm todos os elementos necessários para a instauração do processo Arbitral, já as Cláusulas vazias são aquelas que não contêm os elementos mínimos necessários para a instauração da Arbitragem.

Compromisso Arbitral é um mecanismo utilizado após o surgimento de um conflito, onde as partes, sempre de comum acordo, decidem que o litígio será dirimido pela Arbitragem, ou seja, é um contrato realizado entre as partes em que nomeiam um ou mais árbitros para que possam dirimir as dúvidas advindas da relação jurídica, refere-se a litígio atual e específico.

Seria uma Convenção bilateral na qual as partes renunciam ao Poder Judiciário Publico e se obrigam a dirimir os litígios através da decisão proferida pelos Árbitros por elas indicados. Trata-se da segunda maneira de manifestar a convenção arbitral. Está prevista e definida no art.9º da Lei 9.307/96, sendo a Convenção onde as partes submetem o litígio à Arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ainda ser judicial ou extrajudicial.

No caso de omissão a cerca da instituição da Arbitragem, a parte interessada deverá interpelar a outra parte para iniciar o Processo Arbitral, esta interpelação poderá ser realizada de qualquer forma, desde que possa ser comprovada o seu recebimento, devendo conter o local, o dia e a hora para que o interpelado deverá comparecer para firmar o Compromisso Arbitral. Ressaltando-se que a recusa ou o não comparecimento em firmar o Compromisso Arbitral não trará nenhum ônus ao interpelante, devendo o mesmo ingressar no Poder Judiciário que originalmente iria julgar a lide.

O Compromisso Arbitral dispõe dos mesmos requisitos subjetivos da Cláusula Compromissória, devendo as partes livremente estabelecer em comum acordo a utilização da Arbitragem para solucionar litígios oriundos do contrato, bem como, que as partes sejam plenamente capazes, nos termos do Art. 104, inciso I, do Código Civil, e só poderá versar sobre assunto relacionado a direito patrimonial disponível.

O Compromisso Arbitral deverá preencher os formalismos impostos pela Lei, no caso do Compromisso ser judicial deverá ser lavrado a termo nos próprios autos, e, no caso de ser extrajudicial deverá ser através de documento por escrito particular, em ambos os casos assinado por duas testemunhas, ou por instrumento público.

Ressalta-se que a Lei em nenhum momento prevê expressamente que o Compromisso Arbitral deverá ser escrito, porém, apenas por escrito, no meu entendimento, é que poderemos respeitar os requisitos obrigatórios que veremos a seguir:

- nome, profissão, estado civil e domicílio das partes;
- se realizado por procuradores, necessário poderes especiais para esse ato;
- nome, profissão e domicílio do árbitro (ou árbitros), a identificação da entidade à qual as partes delegaram a indicação de árbitros;
- determinar qual a matéria que será objeto da arbitragem;
- estabelecer o lugar em que será proferida a sentença arbitral.
Existem também os requisitos facultativos que as partes poderão pactuar no compromisso, observamos tais requisitos no Art. 11 da Lei, quais são:
- o compromisso arbitral poderá conter o local onde se desenvolverá a arbitragem;
- autorizar, expressamente, que o árbitro julgue por equidade. Não sendo, nada pelas partes, convencionado, caberá ao arbitro julgar com as regras do Direito estrito;
- as partes podem estabelecer o prazo para a apresentação da sentença arbitral;
- escolha da lei nacional ou as regras corporativas aplicáveis à arbitragem;
- acordar, livremente, sobre a responsabilidade pelo pagamento dos honorários e das despesas com a arbitragem. Não sendo estipulada a responsabilidade, as partes serão solidariamente responsáveis.
- fixar os honorários do arbitro no compromisso arbitral.

Tais requisitos facultativos não são únicos, podendo as partes estipular qualquer cláusula, desde que não contrária à Lei, à ordem pública e aos bons costumes.

Existem duas espécies de Compromisso Arbitral, a judicial e a extrajudicial:

A judicial poderá ocorrer de duas formas, primeiramente poderá ocorrer quando mesmo existindo a Cláusula Compromissória uma das partes criar obstáculos para dirimir o litígio através da Arbitragem, impondo dificuldades para lavrar o Compromisso, desta forma a outra parte ingressará Judicialmente para que ocorra o cumprimento da declaração de vontade instituída no contrato, e poderá ocorrer também quando no tramite do processo, as partes resolverem extingui-lo sem julgamento do mérito, de comum acordo, para que o litígio seja resolvido através da Arbitragem, desta forma, a Cláusula Compromissória será celebrada por termo nos próprios autos.

A extrajudicial ocorrerá quando as partes decidirem voluntariamente, mesmo quando não for instituída a Cláusula Compromissória, ou quando ainda não existir demanda ajuizada, que o conflito existente será submetido à decisão de um Arbitro, desta forma lavrar-se-á o Compromisso Arbitral. Esse Compromisso será lavrado através de escritura pública ou através de documento particular, sendo obrigatória a assinatura de duas testemunhas.

O Compromisso Arbitral poderá ser extinto em três hipóteses em consonância coma Lei de Arbitragem, poderá ser extinto quando antes de aceita a nomeação qualquer árbitro recusar-se, e as partes terem deliberado que não seria aceito substituto; o segundo caso de extinção será quando, também, deliberado, que não seria aceito substituto em caso de falecimento ou impossibilidade do árbitro proferir seu voto; e por último, quando tiver expirado o prazo fixado no compromisso e o árbitro, embora notificado a respeito do prazo de 10 dias para apresentar a sentença arbitral, não apresente sua decisão.

Assim, podemos concluir através do estudo da Arbitragem com foco na Convenção de Arbitragem que o uso da Arbitragem remota aos nossos antepassados, temos notícias da utilização do instituto da Arbitragem desde a Grécia Clássica e do Império Romano, e inclusive no Brasil desde a Constituição de 1824 ela já aparece inserida em nosso ordenamento Jurídico, porém sendo apenas regulamentada em 1996, através da Lei 9.307, mais conhecida como Lei Marco Maciel.

Devemos ressaltar que com a regulamentação da Lei 9.307/96 o instituto da Arbitragem no Brasil passou a ter uma maior segurança, afinal, anteriormente só tínhamos em nosso ordenamento jurídico previsões a cerca da Arbitragem.

Com os nossos Tribunais abarrotados, com nossos Juizes assoberbados de processos a serem movimentados, julgados e executados, fica clarividente que atualmente nosso Judiciário está na UTI, no vermelho ou pra sermos mais precisos num caminho rumo ao fundo do poço sem precedentes na história Jurídica Nacional, o nosso Judiciário está completamente falido.

Contudo existe uma possibilidade de revertermos esta situação caótica em que o Judiciário Pátrio se encontra, através da Arbitragem, que já é largamente utilizada e bem sucedida em países desenvolvidos como Japão e EUA.

Observamos como principais aspectos da Convenção de Arbitragem o fator determinante da vontade das partes em querer dirimir o litígio através da Arbitragem e o fato da Arbitragem só poder ser realizada quando se tratar de direito patrimonial disponível, observamos também que a Convenção da Arbitragem abrange a Cláusula Compromissória e o Compromisso Arbitral.

Quanto a Cláusula Compromissória verificamos que ela é um instituto que é utilizado antes que ocorram divergências a cerca do contrato, antes de surgirem controvérsias, podendo ser acordada no ato da concretização da relação jurídica ou através de adendo se as partes em comum acordo assim resolverem fazer, é uma Cláusula que se refere a conflito futuro e incerto.

Quanto ao Compromisso Arbitral, este surge após a concretização da relação jurídica, não é previsto no contrato pactuado pelas partes, desta forma retrata o conflito atual e específico, ao surgimento de uma lide, as partes de comum acordo lavram o Compromisso prevendo as regras que serão utilizadas no Juízo Arbitral, bem como escolhem o Arbitro que irá instruir e julgar o processo Arbitral.

JUIZ MEDIADOR INTERNACIONAL DE CONFLITOS

JUIZ MEDIADOR INTERNACIONAL DE CONFLITOS
CÂMARA DE ARBITRAGEM E MEDIAÇÃO DO CEARÁ - CAMECE