sábado, 10 de novembro de 2012

MEDIAÇÃO E DIREITOS HUMANOS - CONSULTORIA JURÍDICA PREVENTIVA                                      

         Mediação e Direitos Humanos

Sobre:

Melhor PREVENIR do que REMEDIAR. Então, MEDIAR com alternativas de solução de Conflitos, em curto espaço temporal, vem a ser JUSTIÇA PREVENTIVA, onde a causa proposta pelas partes envolvidas na querela, finaliza com ACORDO DE PAZ. Bispo Kyrillos.
Misión:
VIRTUAL CONSULTORIA JURÍDICA PREVENTIVA

como A Facebook de Pesquisa de Recursos Legais é de iniciativa pública, vinculada ao Mediação E Direitos Humanos - https://www.facebook.com/MediacaoEDireitosHumanos

Sua missão é:

"Gerar e difundir o conhecimento legal e de direito básico necessário para o desenvolvimento sustentável da Justiça Preventiva no Brasil e no Mundo onde cada Cidadão/Cidadã saiba a direção a seguir em busca da solução do seu conflito, do seu problema, da sua necessidade de Proteção da Lei, em qualquer área do Direito e da Justiça Nacional e Internacional antes de vir a ser PASSIVO DE PUNIÇÃO COMO TRANSGRESSOR".

Aqui em Mediação E Direitos Humanos A INFORMAÇÃO ONLINE estará para consulta do Internauta Universal que busca CONHECER A LEI E SUA APLICAÇÃO PARA LIBERTAR-SE. POIS SER LIVRE É: RESPEITAR AS LEIS, CUMPRINDO-AS EM SUA JUSTIÇA E AUTENTICIDADE FORMAL E NATURAL.
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"A cidadania cosmopolita é um dos principais limites para a atuação do poder soberano, pois dá garantia da proteção internacional na falta da proteção do Estado Nacional."

"A justiça atrasada não é justiça, senão injustiça, qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito escrito das partes, e assim, as lesa no patrimônio, na honra e liberdade"

(Rui Barbosa)

“Que os primeiros juízes sejam aqueles que o demandante e o demandado tenham eleito, a quem o nome de árbitros convêm mais do que o de juízes”

PLATÃO, in DE LEGIBUS

"O mundo que nos espera não está para ser conquistado, mas para ser construído."

A Reinvenção do Mundo, de Jean-Claude Guillebaud

(Bertrand Brasil)

"Três coisas são essenciais para se carregar os pesos da vida:

a esperança, o sonho e o riso"

Immanuel Kant (1724-1804)


PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
Guilherme Assis de Almeida

Guilherme Assis de Almeida é doutor em Direito pela USP; com pós-doutorado em Ciência Política, pelo Núcleo de Estudos da Violência (USP), consultor de Sociedade Civil e Segurança Cidadã do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e professor do UniCEUB/ Brasília. guilhermea@contractual.iadb.org

A proteção global dos direitos humanos: breve síntese histórica

O advento do Direito Internacional dos Direitos Humanos, em 1945, possibilitou o surgimento de uma nova forma de cidadania. Desde então, a proteção jurídica do sistema internacional ao ser humano passou a independer do seu vínculo de nacionalidade com um Estado específico, tendo como requisito único e fundamental o fato do nascimento. Essa nova cidadania pode ser definida como cidadania mundial ou cosmopolita, diferenciando-se da cidadania do Estado-Nação. A cidadania cosmopolita é um dos principais limites para a atuação do poder soberano, pois dá garantia da proteção internacional na falta da proteção do Estado Nacional. Nesse sentido, a relação da soberania com o DIDH é uma relação limitadora.

Tanto o Estado – sujeito de direito clássico do Direito Internacional – como as organizações internacionais, sujeito de direito superveniente, ampliam o campo de atuação do Direito Internacional, mas não o afetam em sua estrutura, uma vez que é a lógica da soberania que pauta a atuação desses sujeitos de direito, conforme estabelecido no Artigo 2, inciso 1, da Carta das Nações Unidas: “A Organização é baseada no princípio da igualdade soberana de todos seus membros”.

Todavia,quando o indivíduo adquire a condição de sujeito de direito na comunidade internacional – o que ocorre por meio do advento do DIDH –, a própria estrutura do Direito Internacional Público sofre um abalo, uma vez que o Estado não pode mais se valer do argumento de estar no exercício de sua soberania para justificar violações de direitos humanos em seu território. Isso ocorre por ser a pessoa humana um sujeito de direito no âmbito da ordem jurídica internacional e a proteção de seus direitos passa a ser um dos objetivos do Direito Internacional Público.

A dignidade da pessoa humana é o valor essencial da proteção dos direitos humanos, possibilitando, no âmbito global, sua proteção por organizações internacionais, que podem ser autorizadas a agir até em oposição ao exercício do poder soberano de determinado Estado. Depois de 1945, a pessoa em uma situação limite pode até perder o direito ao exercício de sua própria nacionalidade, mas não perderá a garantia da proteção internacional.

PROTEÇÃO LOCAL DOS DIREITOS HUMANOS

Cada homem vale pelo lugar onde está: o seu valor como produtor, consumidor, cidadão, depende de sua localização no território. Seu valor vai mudando, incessantemente, para melhor ou para pior, em função das diferenças de acessibilidade (tempo, frequência, preço), independentes de sua própria condição. Pessoas, com as mesmas virtualidades, a mesma formação, até mesmo o mesmo salário têm valores diferentes segundo o lugar em que vivem: as oportunidades não são as mesmas. Por isso, a possibilidade de ser mais ou menos cidadão depende, em larga proporção, do ponto do território onde se está. Enquanto um lugar vem a ser condição de sua pobreza, outro lugar poderia, no mesmo momento histórico, facilitar o acesso àqueles bem e serviços que lhe são teoricamente devidos, mas que, de fato, lhe faltam.
(SANTOS; 1987 p.81)

Um esclarecimento necessário deve se feito em relação à nossa compreensão do adjetivo “local”. Ele aqui é entendido como oposto complementar de “global” e, na própria definição do dicionário, “relativo ou pertencente a determinado lugar ou ao lugar em que se vive”. Como afirma Milton Santos, o local é o espaço, o território onde se vive: o “território de vivência”. Dessa forma, na dimensão global, a dignidade da pessoa humana demanda, muitas vezes, a ação de uma organização internacional para ser eficazmente protegida. No âmbito local, a demanda é outra, pois a interação ocorre no cotidiano, face a face. É necessário o efetivo respeito à dignidade de cada pessoa humana nas suas mais diversas singularidades.

O reconhecimento do outro, do diferente, é o fundamento de uma relação de hospitalidade e também um fator essencial para criação da identidade que, para ser construída, necessita do diálogo com um outro diferente de mim mesmo e que, antes de tudo, reconheça-me enquanto interlocutor (TAYLOR;1992). Eu não posso descobrir isoladamente minha identidade: eu a negocio em um diálogo, em parte exterior, em parte interior, com o outro. Isso é assim porque o desenvolvimento de um ideal de identidade engendrado do interior confere uma importância capital nova ao reconhecimento do outro. Minha própria identidade depende essencialmente de minhas relações dialógicas com os outros (TAYLOR, 1992, p.65, tradução nossa).

O exercício de respeito aos direitos humanos no plano local não se dá no reconhecimento daquele que nos é próximo, semelhante, conhecido e, portanto, a priori respeitado, mas sim diante do outro, do diferente de nós, do diverso, uma vez que: (...) aceitar a diversidade cultural não é um ato de tolerância para com o outro, distinto de mim ou da minha comunidade, mas o reconhecimento desse outro (pessoal e comunitário) como realidade plena, contraditória, como portador de saber, de conhecimentos e práticas por meio das quais ele é e tenta ser plenamente. (COLL, 2006, p. 98).

Esse exercício de reconhecimento da diferença é uma prática constante dos projetos analisados. Conhecer experiencialmente o local do projeto e exercitar a diversidade cultural são duas ações complementares e, por vezes, simultâneas. O Guia de Encaminhamentos da Escola de Justiça e Cidadania, do Projeto Justiça Comunitária, recomenda: “Por isso, uma das tarefas fundamentais do Agente é conhecer os recursos locais, ou seja, saber o máximo sobre todos os tipos de serviços que os moradores da comunidade têm a sua disposição”. Também a publicação Justiça Comunitária, uma experiência estabelece: No mesmo sentido, o Programa Justiça Comunitária, adota a comunidade como esfera privilegiada de atuação, porque concebe a democracia como um processo que, quando exercido em nível comunitário, por agentes e canais locais, promove inclusão social e cidadania ativa, a partir do conhecimento local.

É na instância da comunidade que os indivíduos edificam suas relações sociais e podem participar de forma mais ativa das decisões políticas. É nesse cenário que se estimula a capacidade de autodeterminação do cidadão e de apropriação do protagonismo de sua própria história. O Manual do Balcão de Direitos sugere: Lembre-se sempre dos recursos locais disponíveis. As pessoas gerenciam seus conflitos de alguma forma, seja pela via judicial, seja por vias “privadas”, legítimas ou não, pacíficas ou não. É importante conhecer e reconhecer esses recursos locais (desde que legais e legítimos), eles podem ser úteis em uma mediação, por exemplo.

ASSISTÊNCIA JURÍDICA E DIREITOS HUMANOS

Disse Hegel que: “tornar o direito por causa de sua formação, apenas acessível àqueles que sobre ele eruditamente se debrucem, constitui injustiça igual àquela que o tirano Dionísio cometeu quando mandou postar as tábuas da lei tão alto que nenhum cidadão às pudesse ler”. (ENGISH, p. 139) Artigo 153 parágrafo 32 Será concedido assistência judiciária aos necessitados, na forma da lei. (Constituição Federal de 1969) Artigo 5º...LXXIV: o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. (Constituição Federal 1988) A assistência judiciária está contida na assistência jurídica, sendo a segunda mais ampla e integral (como afirma a CF de 1988). A pergunta a ser feita é: qual o seu limite? Qual o objetivo de atuação da assistência jurídica stricto sensu? Acreditamos que esse objetivo dividase em três principais tarefas:

• acesso ao conhecimento dos direitos da pessoa humana por meio da democratização de informações jurídicas básicas;

• encaminhamento ao Poder Judiciário e outras instâncias do Estado;

• apoio e estimulo ao exercício da cidadania. Essas três tarefas são cumpridas pelos projetos analisados. O cordel educativo do Programa Justiça Comunitária esclarece-nos:

Justiça Comunitária É instrumento que cria Democracia pra todos E promove a cidadania Que ajuda a esclarecer, Evitar e resolver Conflitos e violências Simplificar as questões, Esclarecer as razões E evitar incidências A fotonovela O direito de saber é um exercício concreto da hermenêutica diatópica, de Boa ventura de Sousa Santos. Traduz-se o topoi (lugar comum) jurídico para um topoi de possível compreensão pela comunidade. São os próprios agentes comunitários do projeto que interpretam as personagens da história. Da mesma forma, a reflexão baseada na própria experiência de trabalho da equipe do Viva Rio, contida no Manual dos Balcões de Direito, ilustra a respeito dessas questões:

Não se busca acesso a algo que não se conhece. A primeira barreira era, portanto, cultural, em uma dimensão muito primária: não se pode buscar a reparação de direitos que não se conhece. Entre diversas faltas de acesso, o acesso à informação, de forma geral, e acesso à informação sobre direitos e deveres, em especial, surgiam como desafios. Ao se falar de direitos em uma comunidade, deve-se lembrar que se trata de um conhecimento formais, restritos, acadêmicos, próprios dos chamados operadores do Direito. Poucas pessoas compreendem do que se fala, menos ainda de como se opera. A primeira análise, baseada em uma leitura cultural, dava conta, de que não se conhecia nem se compreendia, de uma forma geral, certas relações como relações direito-dever, e sim como relações de bom senso, sem proteção legal, estatal, jurídica, portanto.

O primeiro desafio era sair da reação e partir para a ação – a democratização de direitos e deveres torna-se, portanto, um conceito chave. Deve-se tornar essas informações comuns, acessíveis, em uma linguagem que se compreenda em qualquer lugar. Romper a barreira do “juridiquês”, que tanto separa “operadores” de “leigos”. Um dos casos recorrentes constantes do Manual do Balcão de Direitos mostra quão básica pode ser a informação e como ela é fundamental para a vida da pessoa atendida. Caso 6: Eu não existo Um tipo de caso que é bem comum, especialmente quando a comunidade tem pessoas de origem de fora da cidade (especialmente interior do país), e que para nós pode parecer muito simples: ausência de documentação civil básica. Sem os documentos básicos, o cidadão “não existe”, via de regra,
para as políticas públicas.

Deve-se ter registrada toda a rede de apoio neste sentido, para que o encaminhamento seja não só eficiente mas “certeiro”: o serviço público muitas vezes não atende a população como poderia e deveria. É importante que a pessoa tenha certeza no caminho que vai seguir, certeza alcançada com informação de qualidade. É preciso ter claro que a prestação de uma assistência jurídica respeitadora da peculiaridade de cada ser humano é também uma forma de exercício da justiça, uma vez que a comunicação e a justiça entrelaçam-se de modo profundo. Esclarece-nos Flávio Vespasiano Di Giorgi {ASSIS DE ALMEIDA, 1992; p. 14}:

Dizer o justo, dizer frequentemente é tão difícil, tão dificultado na nossa realidade por preconceitos, por elitismo; e isso que eu primeiro gostaria de dizer como preliminar a respeito da comunicação, para que a comunicação não apareça assim como uma coisa natural, que não tem impedimentos. Tem sim, na vida social. Nada mais terrível do que você ter o que falar e não conseguir falar porque se sente discriminado. Por outro lado a própria etimologia da palavra “comunicar” é muito bonita: comunicar vem de uma palavra latina munus. Munus é uma palavra que tem dois sentidos: ela quer dizer um presente, um presente em geral decorrente de um serviço que você prestou. Tanto que daí, também vem a palavra remuneração. Significa também um encargo que você assumiu perante seus pares, perante sua comunidade que você se incumbe de realizar, de cumprir.

Agora, comunicar, com o prefixo “co” significa em comum, junto. Significa na verdade, presentear e cumprir o compromisso, juntos. Recompensar e cumprir o compromisso. Parece-me que aí estão dois elementos compreendidos no conceito de justiça. A justiça é, de certa forma, certa compensação: você dar a pessoa que é dela. Por outro lado, é um cumprimento de compromissos que estão nas relações de afeto, nas relações de trabalho. São dois elementos na justiça. Se você se lembra dos três critérios que o Direito Romano se atribuía: honeste vivere (viver honestamente), nemini laedere (não prejudicar a ninguém) e suun cuique tribuere (dar a cada um aquilo que é seu). Você vai ver então que o justo, está muito ligado a idéia de comunicação. Então dizer o justo não é dizer de um lado e o justo de outro, eles e entrelaçam, eles tem um parentesco profundo. No dizer já existe implícita uma idéia de justiça.

Não se pode esquecer que jurídico significa “dizer o justo”. Portanto, assistência jurídica é um trabalho de auxílio para dizer o justo. Dizer o justo tanto do assistente em relação ao assistido, como do assistido em relação ao assistente. Uma assistência jurídica consistente pressupõe um esforço consciente por parte dos agentes do projeto, no sentido de propiciar a descoberta da dignidade humana do(a) assistido(a) no contexto do território onde ele(a) vive, por meio do ato de dizer. Todavia, segundo Di Giorgi, o ato de dizer está permeado de obstáculos e dificuldades (ASSIS DE ALMEIDA, 1992, p. 14).

Muitas pessoas são privadas da consciência de que elas têm, como pessoas, um poder inerente de comunicação. São marginalizadas pelo fato de não terem a norma culta. Então é como se elas não tivessem sequer língua materna, elas não são reconhecidas. E isso amortece realmente a consciência de seus direitos. Há muitas pessoas que não defendem seus direitos não porque não saibam, mas porque estão inibidas. Elas sentem que sua linguagem é desprezada. O exercício da cidadania está em grande parte ligado a você ter ou não reconhecida sua capacidade comunicacional.

SOLUÇÃO DE CONFLITOS, DIREITOS HUMANOS E PREVENÇÃO À VIOLÊNCIA.

Poder Judiciário e mediação

(...) quando ocorre alguma pendência entre os homens, eles recorrem ao juiz. Ir ao encontro deste significa apresentar-se perante a justiça, pois o juiz pretende ser, por assim dizer, a justiça encarnada. Na pessoa do juiz procura-se um terceiro imparcial e alguns chamam os juízes de árbitros e de mediadores, querendo assinalar com isso que, quando se tiver encontrado o homem da justa medida, conseguir-se-á obter a justiça. Portanto, a justiça é a justa medida, pelo menos quando o juiz for capaz de incorporá-la. O juiz mantém a balança equilibrada entre as duas partes. (Aristóteles, Ética a Nicômaco) Esse texto de Aristóteles ilustra o fato de que a busca por um terceiro que não pertença à querela entre as partes é um recurso milenar utilizado pelos mais diversos grupos sociais na busca pela solução de seus conflitos.

Esse terceiro pode ser um juiz, um árbitro, um mediador ou qualquer outra pessoa ou grupo de pessoas capaz de reequilibrar a situação de desigualdade. Na presença de um juiz ou de um árbitro, tem-se a situação conflituosa resolvida pelo “aparato normativo” do Direito. Já na presença de um mediador, a situação é equacionada de forma lícita seguindo as normas do Direito (positivo ou consuetudinário), mas não necessariamente valendo-se do aparato “institucional-normativo” da Dogmática Jurídica. Em qualquer das hipóteses anteriormente expostas, o Direito está presente como baliza de solução dos conflitos. Tal fato é uma constante na história da humanidade, conclusão essa tanto da antropologia como da sociologia do Direito.1 Ao dizer que a solução dos conflitos está fundamentalmente ligada ao Direito, é prudente esclarecer qual a forma de resolução de conflitos e espécie de Direito estamos tratando.

Boaventura de Sousa Santos (1988) propõe duas divisões referentes ao modelo decisório para resolução de conflitos: a adjudicação realizada pelo Poder Judiciário, com a colaboração de outros profissionais do Direito de acordo com as normas da Dogmática Jurídica; e a mediação, que é realizada por agentes diversos do Poder Judiciário ou por integrantes da própria comunidade, não se pautando apenas e tão somente pelo aparato normativo da Dogmática Jurídica, mas fazendo uso principalmente da “novíssima retórica”.2 Entre as diversas formas da mediação amplo sensu, pode ser sugerida a seguinte classificação:

• prevenção de conflitos – por meio da orientação e assistência jurídica;

• negociação – diferencia-se da mediação tendo em vista que o negociador apenas facilita o entendimento entre as partes, não se colocando como um terceiro interveniente;

• mediação stricto sensu – o mediador age como um terceiro interveniente, apresentando ele próprio a forma de resolução do conflito;

• transformação – o terceiro possibilita a transformação de uma situação antagônica (o conflito) em um compromisso de cooperação mútua;

• transcendência – o conflito é totalmente transcendido. 3

São muitas as diferenças encontradas entrmediação amplo sensu e adjudicação. No âmbito desse artigo, analisamos as características que fazem da mediação um trabalho de solução de conflitos e também uma forma de promoção dos direitos humanos e prevenção à violência, quais sejam: a utilização da perspectiva tópico retórica para a busca da decisão; e o trabalho da mediação como oportunidade para o desenvolvimento humano e promoção da convivência.

Boaventura de Sousa Santos (1988, p.43-44), ao comentar o “discurso jurídico de Pasárgada” em oposição ao direito Estatal, esclarece: Recursos tópicos-retóricos: Ao invés do discurso jurídico estatal, o discurso jurídico de Pasárgada faz um grande uso de topoi e, simultaneamente, um escasso uso de leis. Independentemente dos elementos retóricos que duma ou doutra forma sempre intervêm na aplicação das leis a casos concretos, não restam dúvidas que estas são vulneráveis a uma utilização sistemática e dogmática, uma vulnerabilidade que se agudiza com a profissionalização e burocratização das funções jurídicas. E para além dos topoi, o discurso jurídico de Pasárgada recorre ainda a um complexo arsenal de instrumentos retóricos.

Uma das diversas razões pelas quais a perspectiva tópico-retórica é utilizada está ligada à forma de atuação do Poder Judiciário, que se mostra incapaz de interagir com as comunidades em tela. Nesse sentido, Souza Neto menciona que: No âmbito da tipologia dos métodos de solução dos conflitos, apresenta-se a mediação, como capaz de dar conta da ausência do aparato jurídico-estatal nas comunidades faveladas. No âmbito da teoria da decisão, ganha importância a perspectiva tópico-retórica, em substituição à abordagem formal-silogística que caracteriza a aplicação judicial do direito (RIBEIRO; STROZENBERG, 2001, p 82).

Na ausência do Poder Judiciário, utiliza se, inicialmente, a mediação como mera substituta dos órgãos do Estado. Posteriormente, constata-se que a mediação, além de uma prática substituta, é especificamente a prática adequada, uma vez que a perspectiva tópico-retórico tem como característica ser dialógica e localizada. Assim, segundo Souza Neto: “(...)Estas definições do conceito fundamental da tópica já dão conta de seu caráter essencialmente dialógico. Nesta direção, afirma Viehweg que “as premissas fundamentais se legitimam pela aceitação do interlocutor”. Se a argumentação é necessariamente dialógica e, já que ela busca convencer, “toda a argumentação é pessoal; dirige-se a indivíduos em relação aos quais ela se esforça por obter adesão.” Assim é que “uma argumentação é necessariamente situada.” RIBEIRO; STROZENBERG, 2001, p 86).

A descoberta da mediação como forma de solução dos conflitos atende a uma necessidade básica da população local: a solução dos conflitos, além de permitir que, no encaminhamento da resolução de conflitos, homens e mulheres tenham a possibilidade de se descobrirem enquanto sujeitos de direitos dotados de dignidade. Nos processo de mediação, os direitos humanos e necessidades básicas cumprem uma função fundamental: oferecer diretrizes para uma boa decisão. Comenta Johan Galtung: (2006, .p.111). Aqui está uma regra básica: se a realização de um objetivo for de encontro às necessidades humanas básicas – direitos básicos – então ela é legítima. Necessidades básicas, ou seja, sobreviver com bem-estar físico, significando que as necessidades biológicas sejam razoavelmente satisfeitas, vivendo a vida em liberdade, com identidade e sentido. Os direitos humanos refletem isso, não a perfeição, mas com uma boa aproximação. Por isso usa as necessidades básicas como guia.

Mediação e Desenvolvimento Humano

“A amplitude do espaço retórico do discurso jurídico varia na razão inversa do nível de institucionalização da função jurídica e do poder dos instrumentos de coerção ao serviço da produção jurídica”.(SANTOS; 1988, p. 59).

A constatação de Boaventura de Sousa Santos deixa claro que o exercício da retórica no âmbito jurídico é possível à medida que as decisões tomadas não estejam adstritas ao exercício do Poder Judiciário. Enfim, a prática dos projetos em análise de “dizer o direito” possibilita o exercício retórico em ampla escala, que, por sua vez, é fator de fundamental importância para a democratização da vida da comunidade. Ao ter a possibilidade de exercer a capacidade comunicacional em sua plenitude, as pessoas fortalecem-se enquanto cidadãs e têm seus direitos humanos promovidos. Um ponto importante é o exercício retórico não se ater à existência de um orador que se dirige a um auditório. Ambos devem se misturar a tal ponto que se indiferenciem.

Deve-se ter como meta o exercício da novíssima retórica de Boaventura, entendo que a novíssima retórica deverá intensificar a dimensão dialógica intersticial da nova retórica e convertê-la no princípio regulador da prática argumentativa em termos ideais, a polaridade orador/auditório deve perder a rigidez para se transformar numa sequencia dinâmica de posições de orador e de posições de auditório intermutáveis e recíprocas que torne o resultado do intercâmbio argumentativo verdadeiramente, inacabado: por um lado, porque o orador inicial pode acabar por transformar se em auditório e, vice-versa, o auditório em orador e, por outro lado, porque a direção do convencimento é intrinsecamente contingente e reversível.

No exercício da novíssima retórica, o homem ou a mulher descobre-se enquanto sujeito de direito no pleno exercício de sua liberdade. Liberdade aqui entendida não como mero livre-arbítrio, mas como um agir conjunto criador de vínculos. É no exercício da liberdade – segundo Amartya Sen – que se consuma o processo de desenvolvimento. Esse autor apresenta uma visão cosmopolita da liberdade, centrada na pessoa humana como sujeito central e principal beneficiária. A Declaração do Direito ao Desenvolvimento (1986 – Art. 2, inciso 1) estabelece que “a pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento e deve ser participante ativo e seu principal beneficiário”. A pessoa humana é o sujeito central, o Estado não ocupa aqui um papel preponderante, apesar de ser considerado agente necessário e importantíssimo articulador de políticas públicas geradoras de desenvolvimento. Nessa perspectiva, o Estado pode ser um agente facilitador ou não.

A teoria do “Desenvolvimento como Liberdade”, de Amartya Sen, ao abordar o tema do desenvolvimento de uma perspectiva cosmopolita, está para além da lógica do poder soberano do Estado. Isto significa dizer que o fenômeno do poder é visto enquanto ação coletiva e não submissão, seja ela de que tipo for. Esse processo da ação coletiva é que viabiliza a expansão das liberdades individuais, expansão essa propiciadora do desenvolvimento. A responsabilidade fundamental da pessoa é exercitar sua liberdade individual enquanto comprometimento social (SEN; 2000, p.337). O princípio organizador que monta todas as peças em um todo integrado é a abrangente preocupação com o processo do aumento das liberdades individuais e o comprometimento social de ajudar para que isso se concretize (...) o desenvolvimento é realmente um compromisso muito sério com as possibilidades de liberdade.

Essas visões da liberdade e do desenvolvimento como duas ações complementares e a necessidade de se eliminarem os obstáculos ao exercício da liberdade relacionam-se diretamente com a definição de Galtung (1990; p.334) sobre a violência: violência é aqui definida como a causa da diferença entre o potencial e o atual, entre o que poderia ter sido e o que é. A violência é o que aumenta a distância entre o potencial e o atual e o que impede a diminuição dessa distância. Nessa perspectiva, violência é toda ação que impede ou dificulta o desenvolvimento (a diminuição entre o potencial e o atual). Nesse sentido, a não violência deve ser considerada, condição básica e indispensável para o exercício do direito ao desenvolvimento. Tais direitos necessitam estar protegidos, com uma verdadeira “aura” de não violência, já que eles são o fundamento de tudo aquilo que o ser humano pode vir a ser.

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JUSTIFICATIVA

Estabelecida pela Resolução n. 125 a Política Pública de Tratamento Adequado de Conflitos, destacando entre seus princípios informadores a qualidade dos serviços como garantia de acesso a uma ordem jurídica justa, desenvolveu-se conteúdo programático mínimo a ser seguido pelos Tribunais nos cursos de capacitação de serventuários da justiça, conciliadores e mediadores.

Para esse fim mostrou-se necessário compatibilizar a formação mínima exigida para a atuação desses facilitadores e as diferentes realidades econômicas, sociais e geográficas de cada Tribunal, com a adoção de um modelo factível em âmbito nacional.

O modelo é composto por três módulos sucessivos e complementares, que correspondem a diferentes níveis de capacitação. Todos aqueles que irão atuar nos Centro de Resolução de Disputas, inclusive servidores e conciliadores e mediadores já capacitados, necessariamente terão que cursar o Módulo I. Conciliadores e Mediadores terão que cursar os Módulos I e II e finalmente os mediadores terão que se capacitar nos três módulos.

O Módulo I, com 12 horas/aula, denominado “Introdução aos Meios Alternativos de Solução de Conflitos” versará sobre os diferentes meios não adversariais de solução de conflitos, com noções básicas sobre o conflito e a comunicação, disciplina normativa sobre o tema, experiências nacionais e internacionais, assegurando a compreensão dos objetivos da política pública de tratamento adequado de conflitos.

O Módulo II, com 16 horas/aula,denominado “Conciliação e suas Técnicas” se propõe a habilitar os facilitadores na utilização de técnicas autocompositivas de solução de conflitos, com enfoque na negociação e conciliação, trazendo padrões de comportamento ético e posturas exigidas no relacionamento com partes e diferentes profissionais envolvidos no CRD.

O Módulo III, com 16 horas/aula, denominado “Mediação e suas Técnicas” se propõe a habilitar os facilitadores na utilização de técnicas autocompositivas de solução de conflitos, com enfoque na mediação, identificando as diferentes Escolas, a multidisciplinaridade, as formas de sua aplicação, com destaque para a mediação judicial.

Os Módulos II e III serão necessariamente seguidos de estágio supervisionado. Para o Módulo II a carga horária será de 12 horas e para o Módulo III será de 24 horas.

Os certificados de capacitação apenas serão emitidos após a conclusão do estágio supervisionado.
Em relação aos servidores, o módulo I será complementado por módulo específico, destinado a detalhar o “modus operandi” do CRD, os procedimentos administrativos, de orientação ao público e de encaminhamento a entidades parceiras e outros órgãos públicos.

Finalmente, desenvolveu-se Módulo específico para os magistrados, com o objetivo de integrá-los à Política Pública de tratamento adequado de conflitos, apresentando os principais métodos alternativos de solução de conflitos e suas aplicações, bem como detalhando o funcionamento dos CRDs.

MODULO I

Título: INTRODUÇÃO AOS MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS

Público Alvo: Conciliadores, Mediadores, Serventuários da Justiça

Objetivos:
Conscientização sobre a política pública de tratamento adequado de conflitos;
Trazer à reflexão o conflito e seus vários aspectos;
Desenvolver habilidades na área da Comunicação;
Informar sobre panorama nacional e internacional dos meios alternativos de solução de conflitos e principais métodos existentes;
Informar normatização sobre o tema;

Carga horária: 12 horas/aula teóricas, sendo a hora/aula de 50 (cinquenta) minutos.

Disciplinas:

1) Política Pública de Tratamento Adequado de Conflitos (1hora/aula)
a) Princípios Constitucionais: Princípio do acesso à Justiça e pacificação social. Princípio da dignidade de pessoa humana;
b) Importância da capacitação.
c) Mudança de mentalidade: papel do CNJ, Tribunais e Instituições públicas e privadas.

2) Comunicação e Conflito (8 horas/aula):
a) Teoria da Comunicação. Axiomas da comunicação. Escuta ativa. Comunicação nas pautas de interação e no estudo do interrelacionamento humano: aspectos sociológicos (ilusórios/imaginários, paradigmas e preconceitos) e aspectos psicológicos (identidade, interesses, necessidades, interrelações e contrato psicossocial tácito; interrelações pessoais, profissionais e sociais);
b) Teoria Geral do Conflito. Conceito e estrutura. Aspectos objetivos e subjetivos. Formas de resolução dos conflitos: adversariais e não adversariais;

3) Métodos Alternativos de Solução de Conflitos (MASCs) (2 horas/aula):
a) Histórico. Panorama nacional e internacional. Cultura de Paz;
b) Noções gerais e diferenciação entre os principais métodos de resolução de conflitos: judicial, negociação, conciliação, mediação e arbitragem.
c) Diferenças e Semelhanças entre Mediação e Conciliação

4) Enfoque normativo e ético da conciliação e suas aplicações no Poder Judiciário (1 hora/aula):
a) Legislação brasileira sobre conciliação-mediação e Juizados Especiais. Resolução do CNJ. Provimentos dos Tribunais;
c) O terceiro facilitador: funções, postura, atribuições, limites de atuação, imparcialidade X neutralidade, ética, Código de Ética, remuneração e supervisão;

Método: Aulas presenciais, interativas e expositivas, com exercícios, através das técnicas de simulação de casos e exercícios para fixação dos conceitos aprendidos.

Recursos materiais:
Data Show
DVD e filmes
Apostilas
Cadeiras móveis
Flip-chart
Sonorização

Avaliação:
Assiduidade
Apresentação de relatório
Participação nas aulas

Referências:
Livros didáticos
Filmes e artigos temáticos

MODULO II

Título: CONCILIAÇÃO E SUAS TÉCNICAS

Público Alvo: Conciliadores e Mediadores

Objetivos:
Ensinar técnicas autocompositivas de solução de conflitos e sua aplicação prática

Carga horária: 16 horas/aula teóricas, sendo a hora/aula de 50 (cinquenta) minutos.

Disciplinas:

1) Introdução (7 horas/aula):
a) Conceito e filosofia. Conciliação judicial e extrajudicial;
b) Conciliação ou mediação?;
c) Negociação. Conceito. Integração e distribuição do valor das negociações.Técnicas básicas de negociação (a barganha de posições; a separação de pessoas de problemas; concentração em interesses; desenvolvimento de opções de ganho mútuo; Critérios objetivos; melhor alternativa para acordos negociados). Técnicas intermediárias de negociação (estratégias de estabelecimento de rapport; transformação de adversários em parceiros; comunicação efetiva).

2) Conciliação e suas técnicas (7 horas/aula):
a) Etapas (planejamento da sessão, apresentação ou abertura, esclarecimentos ou investigação das propostas das partes, criação de opções, escolha da opção, lavratura do acordo);
b) Técnicas (recontextualização, identificação das propostas implícitas, afago, escuta ativa, espelhamento, produção de opção, acondicionamento das questões e interesses das partes, teste de realidade).

4) Finalização da conciliação (1 hora/aula):
a)Formalização do acordo. Dados essenciais do termo de conciliação (qualificação das partes, número de identificação, natureza do conflito...). Redação do acordo: requisitos mínimos e exeqüibilidade;
b) Encaminhamentos e estatística.

5) O papel do conciliador e sua relação com os envolvidos no processo de conciliação (1 hora/aula):
a) Os operadores do Direito (o magistrado, o promotor, o advogado, o defensor público, etc) e a mediação.
b) Papel e Resistência. Técnicas para estimular advogados a atuarem de forma eficiente na conciliação
c) Contornando as dificuldades: descontrole emocional, embriaguez, desrespeito.

Método: Aulas presenciais, interativas e expositivas, com exercícios, através das técnicas de simulação de casos e exercícios para fixação dos conceitos aprendidos.

Recursos materiais:
Data Show
DVD e filmes
Apostilas
Cadeiras móveis
Flip-chart
Sonorização

Avaliação:
Assiduidade
Apresentação de relatório
Participação nas aulas

Referências:
Livros didáticos
Filmes e artigos temáticos

MÓDULO III

Título: MEDIAÇÃO E SUAS TÉCNICAS

Público Alvo: Mediadores

Objetivos:
Ensinar técnicas autocompositivas de solução de conflitos e sua aplicação prática

Carga horária: 16 horas/aula teóricas, sendo a hora/aula de 50 (cinquenta) minutos.

Disciplinas:

1) A Mediação e sua origem (1hora/aula):
a) Introdução histórica;
b) Panorama mundial;

2) As Escolas ou Modelos de Mediação (04 horas/aula):
a) Os diferentes modelos e suas ferramentas: Harward ou facilitativo, transformativo, circular-narrativo, avaliativo;
b) A negociação cooperativa de Harward (posições e interesses, aspectos emocionais que envolvem a negociação, solução ou soluções parciais ou totais).

3) Mediação e suas técnicas (08 horas/aula):
a) Conceito e filosofia. Mediação judicial e extrajudicial, prévia e incidental;
b) Etapas – Pré-mediação e Mediação propriamente dita (acolhida, declaração inicial das partes, planejamento, esclarecimentos dos interesses ocultos e negociação do acordo);
c) Técnicas ou ferramentas (co-mediação, recontextualização, identificação das propostas implícitas, formas de perguntas, escuta ativa, produção de opção, acondicionamento das questões e interesses das partes, teste de realidade ou reflexão).

4) Áreas de utilização da mediação (1 hora/aula):
a) empresarial, familiar, civil, penal e Justiça Restaurativa.
b) o envolvimento com outras áreas do conhecimento.

9) A mediação judicial (02 horas/aula):
a) Vinculação ao Poder Judiciário?
b) O gerenciamento do processo e os Centros de Resolução de Disputas;
c) A Cultura de Paz (Política Pública e a necessidade de mudança de mentalidade).
d) Código de ética do mediador.

Método: Aulas presenciais, interativas e expositivas, com exercícios, através das técnicas de simulação de casos e exercícios para fixação dos conceitos aprendidos.

Recursos materiais:
Data Show
DVD e filmes
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Sonorização

Avaliação:
Assiduidade
Apresentação de relatório
Participação nas aulas

Referências:
Livros didáticos
Filmes e artigos temáticos

MÓDULO MAGISTRADOS

Título: OS MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS

Público Alvo: magistrados

Objetivos:
Conscientização sobre a política pública de tratamento adequado de conflitos;
Trazer à reflexão a importância da utilização dos meios não adversariais de solução de conflitos;
Informar sobre panorama nacional e internacional dos meios alternativos de solução de conflitos e principais métodos existentes;
Detalhar o funcionamento dos Centros de Resolução de Disputas e a fiscalização dos serviços de conciliadores/mediadores.

Carga horária: 8 horas/aula teóricas, sendo a hora/aula de 50 (cinquenta) minutos.

Disciplinas:

1) Política Pública de Tratamento Adequado de Conflitos (2 horas/aula)
a) Princípios Constitucionais: Princípio do acesso à Justiça e pacificação social. Princípio da dignidade de pessoa humana;
b) Legislação brasileira sobre conciliação-mediação e Juizados Especiais. Resolução do CNJ. Provimentos dos Tribunais;
c) Importância da capacitação.
d) Mudança de mentalidade: papel do CNJ, Tribunais e Instituições públicas e privadas, bem como do juiz coordenador do Centro de Resolução de Disputas.

2) Métodos Alternativos de Solução de Conflitos (MASCs) (2 horas/aula):
a) Histórico. Panorama nacional e internacional. Cultura de Paz;
b) Noções gerais e diferenciação entre os principais métodos de resolução de conflitos: judicial, negociação, conciliação, mediação e arbitragem.
c) Diferenças e Semelhanças entre Mediação e Conciliação. Indicação do método de solução de conflito adequado pelo magistrado.

3) Funcionamento dos Centros de Resolução de Disputas (1 hora/aula)
a) Pré processual. Encaminhamentos aos Juizados Especiais e órgãos de assistência judiciária.
b) Processual.
c) Serviços de orientação e cidadania.
d) Práticas administrativas. Pauta. Livros. Estatística.

4) Da relação dos magistrados com os conciliadores/mediadores (2 horas/aula)
a) Recrutamento;
b) Capacitação. Estágio Supervisionado. Reciclagem;
c) Cadastro dos Tribunais. Inclusão e exclusão. Procedimento. Controle de Freqüência.
d) O terceiro facilitador: funções, postura, atribuições, limites de atuação, imparcialidade X neutralidade, Código de Ética, remuneração e supervisão;
e) Satisfação do usuário. Formulário.

5) Da rede de cidadania (1 hora/aula)
a) Convênios. Parcerias.
b) Encaminhamentos. Padronização

Método: Aulas presenciais, interativas e expositivas, com exercícios, através das técnicas de simulação de casos e exercícios para fixação dos conceitos aprendidos.

Recursos materiais:
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DVD e filmes
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Avaliação:
Assiduidade
Apresentação de relatório
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Referências:
Livros didáticos
Filmes e artigos temáticos

MÓDULO SERVIDORES

Título: Da atuação no Centro de Resolução de Disputas

Público Alvo: Servidores

Objetivos:

Detalhar procedimentos e rotinas do CRD

Carga horária: 4 horas/aula teóricas, sendo a hora/aula de 50 (cinquenta) minutos.

Disciplinas:

1) Procedimento no CRD (1hora/aula):
a) Pré processual. Encaminhamentos aos Juizados Especiais e órgãos de assistência judiciária;
b) Processual;
c) Serviços de orientação e cidadania.

2) Práticas administrativas (1hora/aula)
a) Inclusão e exclusão de conciliadores/mediadores no cadastro dos Tribunais.
b) Pauta. Livros. Estatística.

3) Fiscalização dos serviços de conciliadores e mediadores (1hora/aula)
a) Ética;
b) Impedimento/suspeição;
c) Comunicações ao Juiz Coordenador do CRD

4) Rede de cidadania (1hora/aula)
a) Convênios. Parcerias.
b) Encaminhamentos. Padronização

Método: Aulas presenciais, interativas e expositivas, com exercícios, através das técnicas de simulação de casos e exercícios para fixação dos conceitos aprendidos.

Recursos materiais:
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Avaliação:
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Referências:
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Descripción
RESOLUÇÃO Nº 125, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2010

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e regimentais,

CONSIDERANDO que compete ao Conselho Nacional de Justiça o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, bem como zelar pela observância do art. 37 da Constituição da República;

 CONSIDERANDO que a eficiência operacional, o acesso ao sistema de Justiça e a responsabilidade social são objetivos estratégicos do Poder Judiciário, nos termos da Resolução/CNJ nº 70, de 18 de março de 2009;

CONSIDERANDO que o direito de acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal além da vertente formal perante os órgãos judiciários, implica acesso à ordem jurídica justa;

CONSIDERANDO que, por isso, cabe ao Judiciário estabelecer política pública de tratamento adequado dos problemas jurídicos e dos conflitos de interesses, que ocorrem em larga e crescente escala na sociedade, de forma a organizar, em âmbito nacional, não somente os serviços prestados nos processos judiciais, como também os que possam sê-lo mediante outros mecanismos de solução de conflitos, em especial dos consensuais, como a mediação e a conciliação;

CONSIDERANDO a necessidade de se consolidar uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios;

CONSIDERANDO que a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que a sua apropriada disciplina em programas já implementados nos país tem reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças;

CONSIDERANDO ser imprescindível estimular, apoiar e difundir a sistematização e o aprimoramento das práticas já adotadas pelos tribunais;

CONSIDERANDO a relevância e a necessidade de organizar e uniformizar os serviços de conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução de conflitos, para lhes evitar disparidades de orientação e práticas, bem como para assegurar a boa execução da política pública, respeitadas as especificidades de cada segmento da Justiça;

CONSIDERANDO que a organização dos serviços de conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução de conflitos deve servir de princípio e base para a criação de Juízos de resolução alternativa de conflitos, verdadeiros órgãos judiciais especializados na matéria;

CONSIDERANDO o deliberado pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça na sua 117ª Sessão Ordinária, realizada em de 23 de 2010, nos autos do procedimento do Ato 0006059-82.2010.2.00.0000;

RESOLVE:

Capítulo I

Da Política Pública de tratamento adequado dos conflitos de interesses

Art. 1º Fica instituída a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade.

Parágrafo único. Aos órgãos judiciários incumbe, além da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão.

Art. 2º Na implementação da Política Judiciária Nacional, com vista à boa qualidade dos serviços e à disseminação da cultura de pacificação social, serão observados: centralização das estruturas judiciárias, adequada formação e treinamento de servidores, conciliadores e mediadores, bem como acompanhamento estatístico específico.

Art. 3º O CNJ auxiliará os tribunais na organização dos serviços mencionados no art. 1º, podendo ser firmadas parcerias com entidades públicas e privadas.

Capítulo II

Das Atribuições do Conselho Nacional de Justiça

Art. 4º Compete ao Conselho Nacional de Justiça organizar programa com o objetivo de promover ações de incentivo à autocomposição de litígios e à pacificação social por meio da conciliação e da mediação.

Art. 5º O programa será implementado com a participação de rede constituída por todos os órgãos do Poder Judiciário e por entidades públicas e privadas parceiras, inclusive universidades e instituições de ensino.

Art. 6º Para desenvolvimento dessa rede, caberá ao CNJ:

I – estabelecer diretrizes para implementação da política pública de tratamento adequado de conflitos a serem observadas pelos Tribunais;

II – desenvolver conteúdo programático mínimo e ações voltadas à capacitação em métodos consensuais de solução de conflitos, para servidores, mediadores, conciliadores e demais facilitadores da solução consensual de controvérsias;

III – providenciar que as atividades relacionadas à conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução de conflitos sejam consideradas nas promoções e remoções de magistrados pelo critério do merecimento;

IV – regulamentar, em código de ética, a atuação dos conciliadores, mediadores e demais facilitadores da solução consensual de controvérsias;

V – buscar a cooperação dos órgãos públicos competentes e das instituições públicas e privadas da área de ensino, para a criação de disciplinas que propiciem o surgimento da cultura da solução pacífica dos conflitos, de modo a assegurar que, nas Escolas da Magistratura, haja módulo voltado aos métodos consensuais de solução de conflitos, no curso de iniciação funcional e no curso de aperfeiçoamento;

VI – estabelecer interlocução com a Ordem dos Advogados do Brasil, Defensorias Públicas, Procuradorias e Ministério Público, estimulando sua participação nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania e valorizando a atuação na prevenção dos litígios;

VII – realizar gestão junto às empresas e às agências reguladoras de serviços públicos, a fim de implementar práticas autocompositivas e desenvolver acompanhamento estatístico, com a instituição de banco de dados para visualização de resultados, conferindo selo de qualidade;

VIII – atuar junto aos entes públicos de modo a estimular a conciliação nas demandas que envolvam matérias sedimentadas pela jurisprudência.

Capítulo III

Das Atribuições dos Tribunais

Seção I

Dos Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos

Art. 7º Os Tribunais deverão criar, no prazo de 30 dias, Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos, compostos por magistrados da ativa ou aposentados e servidores, preferencialmente atuantes na área, com as seguintes atribuições, entre outras:

I – desenvolver a Política Judiciária de tratamento adequado dos conflitos de interesses, estabelecida nesta Resolução;

II – planejar, implementar, manter e aperfeiçoar as ações voltadas ao cumprimento da política e suas metas;

III – atuar na interlocução com outros Tribunais e com os órgãos integrantes da rede mencionada nos arts. 5º e 6º;

IV – instalar Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania que concentrarão a realização das sessões de conciliação e mediação que estejam a cargo de conciliadores e mediadores, dos órgãos por eles abrangidos;

V – promover capacitação, treinamento e atualização permanente de magistrados, servidores, conciliadores e mediadores nos métodos consensuais de solução de conflitos;

VI – na hipótese de conciliadores e mediadores que atuem em seus serviços, criar e manter cadastro, de forma a regulamentar o processo de inscrição e de desligamento;

VII – regulamentar, se for o caso, a remuneração de conciliadores e mediadores, nos termos da legislação específica;

VIII – incentivar a realização de cursos e seminários sobre mediação e conciliação e outros métodos consensuais de solução de conflitos;

IX – firmar, quando necessário, convênios e parcerias com entes públicos e privados para atender aos fins desta Resolução.

Parágrafo único. A criação dos Núcleos e sua composição deverão ser informadas ao Conselho Nacional de Justiça.

Seção II

Dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania

Art. 8º Para atender aos Juízos, Juizados ou Varas com competência nas áreas cível, fazendária, previdenciária, de família ou dos Juizados Especiais Cíveis e Fazendários, os Tribunais deverão criar os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (“Centros”), unidades do Poder Judiciário, preferencialmente, responsáveis pela realização das sessões e audiências de conciliação e mediação que estejam a cargo de conciliadores e mediadores, bem como pelo atendimento e orientação ao cidadão.

§ 1º Todas as sessões de conciliação e mediação pré- processuais deverão ser realizadas nos Centros, podendo, excepcionalmente, as sessões de conciliação e mediação processuais ser realizadas nos próprios Juízos, Juizados ou Varas designadas, desde que o sejam por conciliadores e mediadores cadastrados junto ao Tribunal (inciso VI do art. 7º) e supervisionados pelo Juiz Coordenador do Centro (art. 9º).

§ 2º Os Centros deverão ser instalados nos locais onde exista mais de um Juízo, Juizado ou Vara com pelo menos uma das competências referidas no caput.

§ 3º Nas Comarcas das Capitais dos Estados e nas sedes das Seções e Regiões Judiciárias, bem como nas Comarcas do interior, Subseções e Regiões Judiciárias de maior movimento forense, o prazo para a instalação dos Centros será de 4 (quatro) meses a contar do início de vigência desta Resolução.

§ 4º Nas demais Comarcas, Subseções e Regiões Judiciárias, o prazo para a instalação dos Centros será de 12 (doze) meses a contar do início de vigência deste ato.

§ 5º Os Tribunais poderão, excepcionalmente, estender os serviços do Centro a unidades ou órgãos situados em outros prédios, desde que próximos daqueles referidos no § 2º, podendo, ainda, instalar Centros nos chamados Foros Regionais, nos quais funcionem dois ou mais Juízos, Juizados ou Varas, observada a organização judiciária local.

Art. 9º Os Centros contarão com um juiz coordenador e, se necessário, com um adjunto, aos quais caberá a sua administração, bem como a supervisão do serviço de conciliadores e mediadores. Os magistrados serão designados pelo Presidente de cada Tribunal dentre aqueles que realizaram treinamento segundo o modelo estabelecido pelo CNJ, conforme Anexo I desta Resolução.

§ 1º Caso o Centro atenda a grande número de Juízos, Juizados ou Varas, o respectivo juiz coordenador poderá ficar designado exclusivamente para sua administração.

§ 2º Os Tribunais deverão assegurar que nos Centros atuem servidores com dedicação exclusiva, todos capacitados em métodos consensuais de solução de conflitos e, pelo menos, um deles capacitado também para a triagem e encaminhamento adequado de casos.

§ 3º O treinamento dos servidores referidos no parágrafo anterior deverá observar as diretrizes estabelecidas pelo CNJ conforme Anexo I desta Resolução.

Art. 10. Cada unidade dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania deverá obrigatoriamente abranger setor de solução de conflitos pré-processual, setor de solução de conflitos processual e setor de cidadania, facultativa a adoção pelos Tribunais do procedimento sugerido no Anexo II desta Resolução.

Art. 11. Nos Centros poderão atuar membros do Ministério Público, defensores públicos, procuradores e/ou advogados.

Seção III

Dos Conciliadores e Mediadores

Art. 12. Nos Centros, bem como em todos os demais órgãos judiciários nos quais se realizem sessões de conciliação e mediação, somente serão admitidos mediadores e conciliadores capacitados na forma deste ato (Anexo I), cabendo aos Tribunais, antes de sua instalação, realizar o curso de capacitação, podendo fazê-lo por meio de parcerias.

§ 1º Os Tribunais que já realizaram a capacitação referida no caput poderão dispensar os atuais mediadores e conciliadores da exigência do certificado de conclusão do curso de capacitação, mas deverão disponibilizar cursos de treinamento e aperfeiçoamento, na forma do Anexo I, como condição prévia de atuação nos Centros.

§ 2º Todos os conciliadores, mediadores e outros especialistas em métodos consensuais de solução de conflitos deverão submeter-se a reciclagem permanente e à avaliação do usuário.

§ 3º Os cursos de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento de mediadores e conciliadores deverão observar o conteúdo programático e carga horária mínimos estabelecidos pelo CNJ (Anexo 1) e deverão ser seguidos necessariamente de estágio supervisionado.

§ 4º Os mediadores, conciliadores e demais facilitadores do entendimento entre as partes ficarão sujeitos ao código de ética estabelecido pelo Conselho (Anexo III).

Seção IV

Dos Dados Estatísticos

Art. 13. Os Tribunais deverão criar e manter banco de dados sobre as atividades de cada Centro, com as informações constantes do Anexo IV.

Art. 14. Caberá ao CNJ compilar informações sobre os serviços públicos de solução consensual das controvérsias existentes no país e sobre o desempenho de cada um deles, por meio do DPJ, mantendo permanentemente atualizado o banco de dados.

Capítulo IV

Do Portal da Conciliação

Art. 15. Fica criado o Portal da Conciliação, a ser disponibilizado no sítio do CNJ na rede mundial de computadores, com as seguintes funcionalidades, entre outras:

I – publicação das diretrizes da capacitação de conciliadores e mediadores e de seu código de ética;

II – relatório gerencial do programa, por Tribunal, detalhado por unidade judicial e por Centro, com base nas informações referidas no Anexo IV;

III – compartilhamento de boas práticas, projetos, ações, artigos, pesquisas e outros estudos;

IV – fórum permanente de discussão, facultada a participação da sociedade civil;

V – divulgação de notícias relacionadas ao tema;

VI – relatórios de atividades da “Semana da Conciliação”.

Parágrafo único. A implementação do Portal será gradativa, observadas as possibilidades técnicas, sob a responsabilidade do CNJ.

Disposições Finais

Art. 16. O disposto na presente Resolução não prejudica a continuidade de programas similares já em funcionamento, cabendo aos Tribunais, se necessário, adaptá-los aos termos deste ato.

Art. 17. Compete à Presidência do Conselho Nacional de Justiça, com o apoio da Comissão de Acesso ao Sistema de Justiça e Responsabilidade Social, coordenar as atividades da Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses, cabendo-lhe instituir, regulamentar e presidir o Comitê Gestor da Conciliação, que será responsável pela implementação e acompanhamento das medidas previstas neste ato.

Art. 18. Os Anexos integram esta Resolução e possuem caráter vinculante, à exceção do Anexo II, que contém mera recomendação.

Art. 19. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Ministro Cezar Peluso
Presidente

terça-feira, 7 de agosto de 2012

 

A utilidade da arbitragem como forma jurisdicional de resolução dos conflitos

 

Informações sobre Hebert Mendes de Araújo Schutz

 

Oficial de Justiça-Avaliador Judiciário do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás/Especialista em Direito Processual Civil/Pós-graduado em Ciências Penais e Docência Universitária. Mestrando em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela PUC-GO. Professor do curso de Direito na Faculdade Objetivo em Rio Verde-GO

RESUMO



Este trabalho trata da utilidade da arbitragem como forma jurisdicional de resolução dos conflitos.
Nele, analisa-se o instituto da arbitragem como possibilidade de resolução de conflitos através da intervenção de outrem que recebe seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta pactuação sem intervenções do Estado, sendo que a sentença proferida na utilização dela produz efeito judicial.

A arbitragem também conhecida como justiça privada está amplamente caracterizada como atuação de efeito jurisdicional, ou seja, quando um terceiro, por meio da arbitragem resolve o conflito, e este atua como se o Estado fosse, sem duvida alguma há jurisdição. Contudo, é sabido na seara do Direito que a jurisdição não é monopólio do Estado, e que este tem participação fundamental na arbitragem, que é uma das formas de heterocomposição dos conflitos.

Em linhas gerais, a utilização da arbitragem para resolver problemas cotidianos busca satisfazer os interesses do cidadão, com vistas a uma entrega célere da prestação jurisdicional.

Por fim, o conteúdo deste mostra um caminho alternativo de solução de conflitos pouco utilizado pelos operadores do Direito e que a utilização da arbitragem é uma necessidade em momento de racionalização da atividade judiciária que os novos tempos exigem.

Palavras-chave: Utilidade, Arbitragem, Jurisdição, Resolução de conflitos.

1. INTRODUÇÃO

 

É sabido por todos que labutam na atividade jurídica que o Estado, através do Poder Judiciário não tem condições de solucionar a grande demanda de processos com a estrutura na qual se encontra.
Os estudos realizados até o momento apontam para a necessidade de um estudo critico e de uma reforma de todo o aparelho normativo e judicial, passando pela reforma dos procedimentos e dos próprios tribunais, que devem modernizar-se, bem como da simplificação do próprio direito positivo.
A tendência do direito processual para o futuro é voltada à busca de um direito e uma justiça mais acessível, essa busca de uma consciência jurídica para a dimensão social do processo é objeto de estudo de muitos juristas nacionais e estrangeiros.

É importante dizer que os meios ou formas alternativas de solução de conflitos não visam o enfraquecimento do Poder Judiciário. A solução do problema pela autodefesa, ou a escolha entre a solução do problema através da tutela estatal ou paraestatal não significa que é melhor ou pior, mas formas distintas em que as pessoas buscam a solução de problemas.

Demonstraremos que o conflito é algo importante na vida das pessoas e das sociedades das quais fazemos parte. Se a humanidade sempre demonstrou forte interesse por suas crises e por seus conflitos, é porque eles podem alterar substancialmente o rumo de nossa existência e o destino de nossas famílias, de nossas comunidades e de nossos países.

Boa parte das pessoas dedica-se a buscar segurança e proteção e a criar sistemas de solução de conflitos de todos os tipos, enquanto os demais trabalham para produzir os bens necessários à subsistência e à melhoria das condições de vida.

Todas as pessoas dedicam uma parte de suas vidas ao esforço de encontrar soluções as suas crises e para os seus conflitos. Quando estamos tristes, aborrecidos ou preocupados, estamos, ao mesmo tempo, em plena atividade para encontrar solução aos nossos conflitos com nós mesmos ou com os outros.

Veremos nesse trabalho, que a justiça também se estabeleceu com a finalidade de solucionar os litígios e conflitos que pudessem surgir entre pessoas de uma mesma comunidade. Quando alguém causa algum mal ou prejuízo a outro, em vez de permitir que os desejos de vingança dominem as respostas dos prejudicados, estabelece-se um sistema judicial, uma idéia de justiça, que procura elucidar quem está com a razão e tenta estabelecer soluções pouco onerosas, razoáveis e justas, visando a solução do problema em questão.

Por outro lado, encontramos a autocomposição, onde as parte podem renunciar e transacionar para obter o resultado mais satisfatório, esse modelo pressupõe que os conflitos entre as partes devam ser resolvidos autonomamente por elas próprias, cabendo ao Estado, preponderantemente, o papel de assegurar um ambiente institucional que propicie o maior equilíbrio de forças entre os conflitantes.
Já o modelo de heterocomposição de conflitos pressupõe a intervenção direta de um terceiro ator na relação, com o poder de julgar o impasse. Esse terceiro ator pode ser o juiz, como ente estatal, e um árbitro privado com delegação pelo Estado, de acordo com a Lei n° 9.307/96, para proferir a sentença, exercendo o papel do Estado na solução dos conflitos.

Nesses termos, é que se faz necessário uma abordagem eminentemente eficaz sobre a arbitragem e sua natureza jurídica, pois se existe uma lei criada pelo Estado, autorizando um terceiro a decidir um conflito, e este como se o Estado fosse, então há jurisdição.

Assim, a jurisdição é a composição da lide através do Estado, que faz às vezes do terceiro alheio às partes. Este, através de pessoas especialmente autorizadas para agir em seu nome, diz qual é a solução mais adequada para a resolução do problema instaurado, sempre se pautando no seu próprio direito objetivo, visando manter a paz social, única capaz de assegurar sua existência e a convivência mútua dos seres humanos.

Portanto, serão mostrados nesse trabalho os antecedentes históricos da arbitragem, questões importantes, e as vantagens que faz com que seja possível fazer justiça em tempo hábil, além de que ela é essencial para o fim da crise no judiciário e uma alternativa para o fim do demandismo que se alastra pelo país.

2. ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA ARBITRAGEM

Conforme LEMOS (2001:23) o "instituto da arbitragem é bem antigo, e começou a ser difundido antes do cristianismo. Originou-se basicamente na cidade de Roma, onde os conflitos eram resolvidos com a autorização das partes, por um terceiro, denominado árbitro.".

Desde tempos remotos, a humanidade busca caminhos que não sejam morosos, burocráticos e onerosos, pois os negócios envolvendo o direito privado exigem soluções rápidas e eficazes. A arbitragem como meio alternativo de solução de conflitos foi bastante utilizada nos tempos de conquista, quando os dominados recusavam os ordenamentos existentes e procuravam terceiros para dirimirem seus problemas, dando lugar a uma arbitragem consensual.
LEMOS (2001:25) afirma o seguinte:
A historia nos revela que a solução dos litígios entre grupamentos humanos encontrou, por diversas vezes, procedimentos pacíficos através da mediação e da arbitragem, ao invés de optar pelas guerras.
E ainda:
De origem consuetudinária, a arbitragem remonta a mais de 3.000 a.Csendo, pois, um dos institutos mãos antigos. Tem-se noticia de soluções amigáveis entre os babilônicos, via arbitragem publica e, entre os hebreus, através das contendas de direito privado se resolviam com a formação de um tribunal arbitral.
Em análise cronológica, o desenvolvimento da arbitragem se deu na Judéia, entre os sábios que preparavam o Talmud, que nada mais era do que repositório de tradições judaicas e interpretações da Lei proposta pelos livros do Pentateuco.

O fato era que existiam restrições impostas pelo conquistador romano ao funcionamento das cortes rabínicas.

Na Babilônia, o outro grande centro jurídico dos judeus, nos séculos que antecederam e sucederam o aparecimento de Cristo, as comunidades judaicas tinham ampla autonomia e as cortes funcionavam sem maiores problemas.

A Mishnah, que era o ensino do povo hebreu determinava que a arbitragem se processasse da seguinte forma:
Questões econômicas se dividem por três. Cada parte escolhe um julgador e ambas as partes escolhem um terceiro; esta a opinião de Rabbi Meir. Os sábios sustentam que os dois julgadores escolhidos escolhem mais um julgador.
Se por ventura os árbitros escolhidos não forem de acordo com a escolha do terceiro arbitro, este poderia ser escolhido pela liderança da comunidade, circunstancia em que poderia ser nomeado sem a concordância das partes. A escolha dos árbitros recaia sobre as pessoas que não fossem parentes, e também era vedado escolher amigos íntimos ou inimigos de qualquer parte.

O sistema arbitral com a presença de três julgadores funcionou por muito tempo na historia do povo judeu.

Convém dizer que, nas comunidades onde havia um tribunal rabínico oficialmente instituído, as partes em demanda tanto podiam optar por um sistema ou pela arbitragem, a questão da escolha do terceiro árbitro era para se ter o desempate em caso de opiniões conflitantes, veja-se que naquela época já existia o voto Minerva.

Em Roma utilizava-se o instituto da arbitragem inicialmente nos conflitos entre Estados e, depois, entre particulares, principalmente na fase do jus peregrinus, quando o praetor peregrinus solucionava as questões entre os estrangeiros.

O juízo arbitral comparando à jurisdição togada, aquele levava vantagens, uma vez que era mais simples e informal e permitia ao árbitro decidir sem se submeter a qualquer lei, bastavam o compromisso e a cláusula compromissória destinados a acatar a decisão arbitral.

Observa SOARES (1996:63):
Acentue-se o fato de que, especialmente nas corporações de ofícios e de profissões liberais, onde imperava rígida hierarquia entre os membros, era natural que se buscassem soluções de controvérsias, por meio de recursos que não saíssem do âmbito daquelas comunidades.
No período Justiniano, o instituto da arbitragem aperfeiçoou-se com a legislação sobre o costume havia criado. A partir daí, os demandantes vinculavam-se à execução do laudo, e aos árbitros cabia a obrigação de bem desempenhar o encargo.

Na Constituição de Justiniano, do ano 531, ficou expresso que, caso fosse instituída a penalidade tanto na cláusula compromissória quanto no compromisso, haveria a interferência do magistrado na execução do laudo arbitral.

O tempo se passou, e o que era utilizado apenas no mundo dos negócios foi estendido ao setor religioso, passando a serem solucionadas as pendências entre leigos ou religiosos pelos bispos, na condição de árbitros. Quando acontecia uma simples divergência, as pessoas diziam para procurarem o bispo, pois este resolveria o problema.

Aponta VENOSA (2004:604) que:
A Igreja Católica Apostólica Romana exerceu ao longo dos tempos um importante papel na solução pacifica de conflitos. O padre era o arbitro supremo e os bispos tinham a função eclética de resolver os litígios de fronteiras e questões privadas.
Os árbitros de então eram investidos de poderes através do compromisso arbitral e utilizavam em constância as penas de cunho religioso, tais como a excomunhão e o interdito.
Quando uma pessoa recebia a sanção de excomunhão, a ela ficava vedado tomar sacramento pelo resto da vida.

Por outro lado, a sansão de interdito proibia o sacramento em determinada cidade ou região, podendo haver, também, a suspensão do oficio da missa, por longo período, sobre aqueles que desrespeitassem o compromisso assumido.

Em conseqüência desses fatos, em meados de 1794, por força da reforma protestante, ocorreu a homologação do Tratado Jay de Amizade, dispondo sobre comercio e navegação, que foi realizado entre os Estados Unidos e a Grã Bretanha. Na realização do Tratado, utilizou-se um numero impar de árbitros, nacionais de inúmeros lugares, no qual se buscava fixar a identidade do rio Santa Cruz, o pagamento aos credores ingleses e cuidar das presas marítimas. Como diz LEMOS (2001:28): "Esse Tratado fez renascer o procedimento de solução pacifica de controvérsias internacionais feito por terceiro alheio ao conflito".

3. A ARBITRAGEM

A arbitragem permaneceu dormente por décadas em nosso país. Muito embora prevista em lei, tínhamos as condições a ela relativas como uma espécie de letra morta. As dificuldades impostas por um modelo superado, jogaram-na num estado de perda de essência, sem que se tivesse qualquer esperança quanto à sua real utilidade.

No entanto, a promulgação e vigência, a partir de novembro de 1996, da Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996, fizeram como que num passe de mágica, a exemplo do que ocorreu no conto infantil, que a sociedade acordasse para a importância desse mecanismo extrajudicial de solução de controvérsias e nele encontrasse um meio eficiente de busca da estabilidade social.

Com o advento da nova Lei produziu-se um fenômeno de renascimento do instituto no Brasil, desenhada que foi de acordo com as mais modernas teorias e fundamentos desenvolvidos em paises que dela se servem há muito tempo. A nova Lei colocou o Brasil na dianteira da modernidade, dotando-o de uma legislação afinada com as conquistas obtidas pela arbitragem ao longo dos anos em que esta, no Brasil, estava dormente.

É certo, pois, dizer que a arbitragem é forma de solução dos conflitos na qual as partes envolvidas convergem as suas vontades no intuito de eleger uma ou mais pessoas, terceiro, distinto dos envolvidos, para que aprecie a demanda e profira uma decisão, que previamente, se comprometem a aceitar e cumprir.

Segundo afirmam TEIXEIRA e ANDREATTA (1997:30), a arbitragem é o: "compromisso através do qual as pessoas interessadas submetem um litígio à decisão de um ou mais árbitros, ficando antecipadamente a respeitar o resultado".
Os autores referem-se à arbitragem como sendo:
Uma técnica para a solução de controvérsia através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta convenção sem intervenção do Estado, sendo destinada a assumir eficácia de sentença judicial.
No mesmo sentido CACHAPUZ (2000:12), parafraseando José Carlos de Magalhães, diz que a arbitragem é: "a instituição pela qual as partes confiam a árbitros que livremente designam a missão de resolver seus litígios".
E ainda:
Um foro privilegiado e propicio para a composição amigável ou para a convergência dos esforços dos litigantes no sentido de alcançarem rapidamente, sem descurar dos valores maiores que são a segurança e a justiça da decisão, a solução final da lide, tendo em vista que, quase sempre, ambos têm interesses na resolução do conflito, que não raras vezes, envolve quantias vultosas de dinheiro, com inúmeros efeitos diretos e reflexos.
Enquanto isso NAZO (1997), obtempera que:
A arbitragem em sentido amplo caracteriza-se todas as vezes que um conflito de interesses for solucionado através da decisão de um terceiro que não esteja investido das funções de magistrado. É a autonomia de vontade das partes, que podem escolher o direito material e processual aplicável à solução da controvérsia, assim como fazer decidir o litígio com base nos princípios gerais do direito, nos usos e costumes ou nas regras internacionais do comércio.
3.1 A arbitragem no Brasil A Constituição de 1824, previa em seu artigo 18, que as partes poderiam nomear juizes árbitros, e que, sendo acordado entre elas, as sentenças seriam executadas sem recurso.
A Constituição de 1937 extinguiu a existência de juízos arbitrais para resolução de conflitos territoriais entre os Estado brasileiros, contudo, a Constituição de 1946 voltou a instituir a faculdade das pessoas em utilizar o juízo arbitral.

A Magna Carta dispõe sobre a arbitragem como meio alternativo de solução de dissídios. No artigo 114, § 1° com nova redação dada pela emenda constitucional n° 45, que introduziu a reforma do judiciário, está implícito a eleição de árbitros para resolver litígios entre empregados e empregadores.
O Brasil não tem cultura na utilização desse instituto, muito embora ele esteve sempre presente no nosso ordenamento jurídico. Antes da edição da Lei n° 9.307/96, o Brasil assinou o Protocolo de Genebra, em 1923, participando igualmente do Código de Bustamante, da Convenção Interamericana sobre a Arbitragem Comercial Internacional do Panamá, em 1975, que fora promulgado em 09 de maio de 1996. Isso é o que afirma LEMOS (2001:32).

Também anterior à Lei da arbitragem, o Código de Processo Civil dispunha o instituto nos artigos 1.072 a 1.102, sendo esses considerados letras mortas, devido a sua inutilização no país.

Todavia, o instituto da arbitragem previsto no Código de Processo Civil ainda não trazia regras modernas, obrigando a homologação judicial do laudo arbitral e simplesmente ignorando a cláusula compromissória. Assim, como o advento da Lei n° 9.307/96, introduziu-se uma nova era para a implementação deste instituto em nosso ordenamento jurídico.

A Lei n° 9.099/95, Lei dos Juizados especiais, traz em seus artigos 24 a 26, a possibilidade da utilização da arbitragem nos juizados. Nesse procedimento dispensa-se o compromisso das partes, e o que se chama de sentença arbitral na Lei n° 9.307/96, neste a denominação é, tão somente, laudo arbitral, que é homologado por sentença irrecorrível.

Vale lembrar que o Código Civil de 2002, trouxe inovação, ao tratar da arbitragem nos artigos 851 a 853, sob o titulo "Do Compromisso". A leitura do artigo 852nos reporta ao artigo 1° da Lei n° 9.307/96, sendo o artigo 3° correspondente ao artigo 853 do Código, que se refere à clausula compromissória para a solução de conflitos através do juízo arbitral.

O Código Civil Brasileiro prevê o compromisso judicial e extrajudicial, para solucionar litígios entre pessoas ligadas contratualmente.

O nosso código, não permite, entretanto, o compromisso para resolver questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não tenham caráter estritamente patrimonial.

É relevante citar, que contratos realizados entre imobiliárias e locadoras, atualmente, elegem as Cortes de Conciliação e Arbitragem, para resolver conflitos que porventura venham a acontecer. A maioria das cortes funciona nas Associações Comerciais das cidades.

A escolha pela arbitragem é no nosso ordenamento jurídico, voluntária ou facultativa, a teor da maioria das legislações estrangeiras. Ela é instituída através de cláusula compromissória ou do compromisso arbitral, aquela expressa no contrato, e esta consistente numa convenção entre as partes que submetem litígio atual aos termos da arbitragem.

Seu inicio se dá após a aceitação e nomeação do arbitro e termina com a sentença arbitral, irrecorrível, salvo nas hipóteses de embargos de declaração e ao visando à anulação da sentença arbitral.
Para CARMONA (1998:27), os motivos que levam as partes a escolher a solução arbitral são:
A ausência de formas solenes, a possibilidade de julgar por equidade ou escolher livremente a lei a ser aplicada e ainda a neutralidade dos árbitros na solução de litígios envolvendo partes de nacionalidade diferentes, alem da especialização técnica dos julgadores.
Nestes termos podemos afirmar que, após 9 (nove) anos da publicação da lei que instituiu as regras da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro, a sua utilização ainda é muito tímida e isto se deve, principalmente, pela falta de informação pela sociedade.

3.2 A arbitragem e sua diferença com o procedimento da Lei dos Juizados Especiais A Lei dos Juizados Especiais, trouxe nos artigos 24 a 26 uma nova regra de arbitragem, utilizada somente no âmbito destes juizados. As regras ali instituídas diferentes da prevista na lei n° 9.307/96.

Na Lei n° 9.099/95, o arbitro é escolhido somente entre os conciliadores/ juizes leigos, quando na lei da arbitragem a escolha é livremente feita pelos interessados. A arbitragem terá o seu inicio conforme as regras do Juizado Especial após a conciliação frustrada, enquanto na regra da lei 9.307 as partes podem eleger estas vias arbitrais antes mesmo de existir o conflito.

Diante das regras da lei do Juizado, a sentença arbitral estará sujeita a homologação judicial, enquanto na lei da arbitragem fica excluída a necessidade da homologação judicial, pois ela própria tem força de sentença judicial.

3.3 Da constitucionalidade da Lei n° 9.307/96. É sobremodo importante assinalar que o instituto da arbitragem, posto em voga pela lei n/ 9.307/96 é de todo constitucional, e não ofende os princípios constitucionais da inafastabilidade de controle judicial, nem do juiz natural, a lei, simplesmente deixa a cargo das partes a escolha, ou seja, se querem elas ver sua lide julgada por juiz estatal ou por árbitros.
É preciso dizer que o interesse é compor a lide, sendo que o arbitro será o representante Estatal na solução pacífica das controvérsias.
Sobre a constitucionalidade da Lei da Arbitragem, CASABONA (2001:45) afirma:
Seria inconstitucional a Lei da Arbitragem se estipulasse arbitragem compulsória, excluindo do exame pelo Poder Judiciário, a ameaça ou lesão a direito. Não fere o juiz natural, pois as partes já estabeleceram, previamente, como será julgada eventual lide existente entre elas. O requisito da pré-constituição na forma da lei, caracterizador do principio do juiz natural, está presente no juízo arbitral.
3.4 Pressupostos da arbitragem. A lei n/ 9.307/96 traz no artigo 1° os pressupostos da arbitragem, quais sejam, capacidade das partes e o objeto litigioso. Quanto à capacidade das partes, determina a lei que somente pessoas "capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem".

Determina a lei que somente poderá instituir a arbitragem pessoas capazes de contratar, não podem instaurar processo arbitral pessoas que detenham apenas poderes de administração e os incapazes, mesmo que representados ou assistidos.

Na questão do objeto, que também é pressuposto da arbitragem, a lei restringe somente a "direito patrimonial disponível". De modo geral, estão afastadas do âmbito do juízo arbitral as ações de família que versem sobre a capacidade das pessoas. É bem verdade que diante de uma ação de alimentos, por exemplo, as partes jamais poderiam pretender o decreto da procedência deste pedido perante a arbitragem.

Todavia, a lei permite a transação entre as partes a respeito do quantum dos alimentos prestados, assim, há de se entender que o quantum dos alimentos prestados não está na esfera do direito patrimonial indisponível, e, portanto, é arbitrável.
Para CARMONA (1998:33):
Diz-se que um direito é disponível quando ele pode ser ou não exercido pelo seu titular, sem que haja norma cogente impondo o comprimento do preceito, sob pena de nulidade ou anulabilidade do ato praticado com sua infrigência. Assim, são disponíveis aqueles bens que podem ser livremente alienados ou negociados, por encontrarem-se desembaraçados, tendo o alienante, plena capacidade jurídica para tanto.
E no mesmo sentido, afirma NERY (2005:1623):
Não estão no âmbito do direito disponível as questões de direito de família, em especial ao estado das pessoas (filiação, pátrio poder, casamento, alimentos), aquelas atinentes ao direito de sucessões, as que têm por objeto as coisas fora do comercio, as obrigações naturais, as relativas ao direito penal, entre tantas outras, já que ficam estas matérias fora dos limites em que podem atuar a autonomia da vontade dos contendentes.
Estes posicionamentos não são suficientes, porém, para excluir de forma absoluta do âmbito da arbitragem toda e qualquer demanda relacionada ao direito familiar ou o penal, pois as conseqüências patrimoniais tanto num caso como no outro podem ser objeto de solução extrajudicial. Dizendo de outro modo, se é verdade que uma demanda que verse sobre o direito de prestar e receber alimentos trata de direito indisponível, não é menos verdadeiro que o quantum dos alimentos pode ser livremente pactuado pelas partes, e isto torna arbitrável esta questão.

Partindo destas premissas, poder-se-ia concluir que as partilhas de bens em separação, divórcio e união estável, a quantum de alimentos devidos e as questões de direito sucessório são arbitráveis, desde que estivesse presente a capacidade dos contratantes, partes do processo arbitral, determinada no artigo 1° da Lei n/ 9.307/96.

Existem juristas que defendem que, na esfera dos direitos de família, o casamento e a guarda entre outros não são arbitráveis, assim como os de caráter patrimonial como alimentos e regime matrimonial de bens.

Embora seja louvável o posicionamento a respeito, discordamos do entendimento de que as ações de direito de família estão totalmente fora do âmbito do juízo arbitral, preferindo a inclusão deste instituto à parte patrimonial das demandas de direito da família.

Alguns países admitem a instituição do juízo arbitral nas ações de família, para aquelas demandas onde o objeto do litígio é direito patrimonial. Cabe aos operadores do direito a tentativa de estender a utilização dos meios alternativos de resolução de controvérsia a todos os meios possíveis, visando à desburocratização do direito e a efetivação da justiça.

3.5 A arbitragem no Direito Comparado Na Argentina o Código de Processo Civil, Art. 737, determina o objeto da arbitragem às questões que podem ser de transação. E assim diz: "Cuestiones excluídas – No podrán comprometerse em árbitros, bajos pena de nulidade, lãs cuestiones que no pueden ser objeto de transacción".

Não é diferente o Código de Processo Civil, Art. 476, do Uruguai, que determina: "Causas excluídas del arbitraje – no pueden someterse a processo arbitral la cuestione respecto a lãs cuales está prohibida la transacción".

No México fica excluída do procedimento da arbitragem toda a matéria que envolve estado de capacidade das pessoas. As demandas decorrentes de relação familiar, de cunho eminentemente patrimonial são administrativas. Os tutores poderão optar pelo juízo arbitral para negócios de seus tutelados.

O artigo 613 do Código de Procedimentos Civiles do México, informa a autorização da utilização da arbitragem nas ações de herança, desde que autorizado por todos os herdeiros.
Autoriza, também esta legislação, a inserção de cláusula compromissória instituída pelo autor da herança, vejamos:
Art. 613. Los albaceas necesitam del consentimento unânime de los herdeiros para comprometer em árbitros los negócios de la herencia y para nombrar árbitros, salvo el caso em que se tratara de cimplimentar el compromiso a cláusula compromisoria pactados por el autor. En este caso, si no hubiere árbitro nombrado se hará necesariamente con intervención judicial.
Na Bélgica a arbitragem é admitida em todos os litígios que versem sobre direitos e relações que admitem a transação, e assim prevê o Code Judiciaire:
Art. 1676. Tout différend déjà né ou qui pourrait naître d’un rapport de droit determine et sur lequel il est permis de transiger, peut faire objet d’uneconvention d’arbitrage.
A lei espanhola n° 36 de 05 de dezembro de 1988, determina em seu artigo 1, a possibilidade da arbitragem nas matérias de livre disposição conforme o direito. Determina ainda o Art. 7, as validades da arbitragem por disposição do testador, vejam:

Art. 1. Mediante el arbitraje, lãs personas naturales o jurídicas puedem someter, prévio convenio, a la decisión de uno o varios árbitros las cuestiones litiosa, surgidas o que puedan surgir, en materias de su libre disposición conforme a derecho".
Art. 7. Excepcionalmente, será valido el arbitrage instituído por la sola voluntad del testador que lo estabeleza para solucionar las diferencias que puedan surgir entre ferederos no forzosos u/o legatarios para cuestiones relativas a la distribuición a administración de la herencia.
O artigo 1.030 do Código de Processo Civil Alemão com a devida tradução determina que:
Admissibilidade da arbitragem. Toda pretensão legal sobre bens pode ser objeto de convenção arbitral. A convenção arbitral será válida sempre que as partes tiverem o direito de transigir sobre o objeto da disputa.
Também temos a disposição do Código de Processo Civil italiano, que em seu artigo 806, proíbe a utilização da arbitragem para os processos trabalhistas e previdenciários, além daqueles que resguardam questões de Estado e de separação pessoal entre cônjuges e as outras que não podem formar objeto de transação.

Nos Estados Unidos da América a arbitragem pode ser instituída em questões que envolvam direito disponível em larga escala nas separações e divórcio. A razão do grande crescimento da utilização da arbitragem nos EUA reside no fato de que neste país existe um grande número de câmaras arbitrais especializadas em direito da família, o que leva ao termino do conflito com mais celeridade que as vias judiciais, com uma boa qualidade de decisões.

Uma forma muito comum é a utilização de uma forma de arbitragem, onde as partes, após a colheita probatória, formulam seus pedidos de acordo e o arbitro decidirá escolhendo uma das propostas.
Assim, o juízo arbitral é utilizado por mais legislações no âmbito do direito de família e nada justifica que em nossa legislação, este instituto não venha a ser utilizado para dirimir estas questões, mormente para os litígios de cunho patrimonial.

Um grande avanço na utilização deste instituto no país é a autorização legal para a inserção de cláusula compromissória em acordo de vontade entre as partes antes de ser instaurado um litígio, como aquelas inseridas nos contratos de convivência e nos pactos antenupciais. É sobremodo importante dizer, que as sentenças arbitrais proferidas no estrangeiro só serão reconhecidas executadas no Brasil se homologadas pelo Supremo Tribunal Federal.

Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/19305/a-utilidade-da-arbitragem-como-forma-jurisdicional-de-resolucao-dos-conflitos/2


6. CONCLUSÃO

 

A questão central deste trabalho foi mostrar que a arbitragem como forma jurisdicional de solução dos concílios, é essencial para o fim da crise no judiciário, posto que é preciso incentivar as conciliações, a fim de reverter um quadro alarmante de demandismo que cada vez mais ocorre no Brasil.

Numa análise perfunctória, essencialmente, a arbitragem, e arbitragem se apresenta como uma alternativa de rapidez, economia e segredo. Esses três motivos, segundo a doutrina, é que levam as partes ao juízo arbitral, ao invés do recurso ao juiz togado.

A demora, às vezes oriunda do inafastável principio do contraditório, às vezes oriundo da sobrecarga de processos em relação à quantidade de juízos disponíveis, sem duvida alguma, serve de desestimulo àqueles que pretendem obter a prestação jurisdicional, servindo, ao final, como meio de descrença no poder jurisdicional como hábil para solucionar controvérsias.

Ao ensejo da conclusão, verifica-se que o acumulo de processos que abarrotam o judiciário, as dificuldades no acesso, na administração e na realização da justiça e a própria desmistificação do estado levar-nos-ão, cedo ou tarde, obrigatoriamente, a adotar mecanismos mais práticos e informais dos aspectos que envolvem a administração da justiça, com tendência transparente e convergente para a utilização, e aprimoramento, dos instrumentos alternativos de solução de conflitos.

Um levantamento (In site web), realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, recentemente, conclui que mais de 250.000 (duzentos e cinqüenta mil) casos já foram resolvidos pelo juízo arbitral.
Com esta noticia verificada no site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, há de se concluir que do ponto de vista dos litigantes, existe uma aceitação da arbitragem, desde que oferecida esta possibilidade.

A arbitragem, e mais especificamente, a nova lei arbitral brasileira parece dar conta de que o Brasil, mesmo que de forma sutil, está no encalço das pegadas da evolução jurisdicional.

Esse instituto pode ser considerado uma excelente opção a jurisdição estatal, mas será preferível que as partes tenham posição de igualdade jurídica dentro da lide. Talvez por isso, tal juízo seja melhor aplicado em relações jurídicas entre empresas, Estados e outras entidades que tenham igualdade na relação contratual.

Com relação à imparcialidade, motivos existem para gerar desconfiança, visto que o árbitro não é investido das mesmas garantias do magistrado. Não obstante, o julgador arbitral poderá sofrer sanções penais e civis, se atuar com parcialidade, favorecendo um dos pólos.

Além disso, não é este um problema somente da arbitragem, até mesmo em órgãos estatais que deveriam selar pela igualdade entre os indivíduos, constata-se casos de corrupção ou favorecimento.
Portanto, observadas as considerações supra citadas, a arbitragem se faz uma opção à jurisdição estatal, configurando-se como meio de contribuir para o desafogamento da jurisdição convencional.
Todavia, é mister que se realizem varias discussões em torno do juízo arbitral para chegar-se a uma melhor aplicabilidade da Lei 9.307/96, e que a sociedade seja conduzida a sua utilização, através da divulgação da existência destas formas de solução de litígios.

O que nos parece certo, é a necessidade de reavaliarmos a nossa justiça e, em sintonia com o contido no preâmbulo da Constituição Federal, isto é, o comprometimento da sociedade, na ordem interna e internacional, com a solução pacifica das controvérsias, implementar, de vez, o sistema que se coaduna, perfeitamente, com os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 4° Edição. Vol. II. Atlas, 2004.
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VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral do Contrato. 4° Edição. Vol. II. Atlas, 2004.

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